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Portal da Damba e da História do Kongo

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Os Zombos na Tradição, na Colónia e na Independência (30)

Publicado por Muana Damba activado 10 Enero 2012, 13:24pm

Etiquetas: #Fragmentos históricos do Uíge.

 

Por Dr José Carlos de Oliveira.


 

 

 
Amendoim e Kikuanga Versus ‘Ração de Reserva’

 
Este título não tem outra intenção senão chamar a atenção das diferenças e similitudes, entre a dieta do guerrilheiro da UPA e a ração de reserva tipo E, como se chamava, a ração do militar português, durante as acções de combate no Norte de Angola, a partir de 1961.
 
Quando a 5ª Companhia de Caçadores Indígenas se incorporou na Companhia de Comando do Batalhão 92 (Setembro de 1961), um episódio se passava que ainda hoje vem à nossa memória – a distribuição da ração de reserva, pelo soldado cantineiro, aquando da saída de cada coluna em serviço operacional. Cada embalagem de cartão continha o suficiente para a alimentação de um dia, variando muito o seu conteúdo de remessa para remessa. Era comum, o sumo concentrado; o leite condensado muito açucarado, em bisnaga, que dava para mais de meio litro de leite; um pacote de bolacha Maria; uma tablete de chocolate; uma embalagem de sobremesa de geleia compacta; uma lata de carne ou de dobrada enlatada, outras vezes, ainda uma lata de sardinhas ou atum e, até mesmo, feijoada com chispe.
 
Todas as sobras eram deixadas a esmo no lugar onde se tinha feito a paragem, sem qualquer preocupação em disfarçá‑las. O comandante da coluna decidia se uma paragem seria oportuna ou não e aproveitava‑se o repouso para comer algo que aconchegasse o estômago. Era muito difícil comer com as viaturas em andamento pois a poeira levantada ao longo da coluna, caía inexoravelmente sobre os corpos dos militares que, nestas circunstâncias, usavam lenços para taparem a boca e o nariz a fim de evitarem a assimilação do pó e de conseguirem respirar. A poeira invadindo tudo, dificultava a deglutição de qualquer alimento.
 
Uma das principais preocupações das chefias militares portuguesas, traduzia‑se na ordem dada aos grupos de combate para cortarem, cercearem ou destruírem os bens alimentares encontrados nas aldeias, que naturalmente serviriam aos operacionais da UPA, impedindo assim, o apoio às suas unidades instaladas nas matas do norte de Angola destruindo, por exemplo, as lavras de mandioca e celeiros de amendoim.
 
Este apoio era de vital importância para a sobrevivência dos guerrilheiros. Os chefes clãnicos zombo estavam expressamente orientados para esta tarefa. Deles dependia a manutenção da operacionalidade dos seus combatentes. Uma forma que devemos apreciar nas relações sociais dos grupos guerrilheiros é que eram e continuam a ser apoiados pelo seu clã e não pelas populações. Esta forma de entender a questão faz a diferença e coloca em causa a afectividade do clã pela comoção de ter em perigo um elemento da sua linhagem.
 
Outros produtos constituíam a base da alimentação zombo, tanto em tempo de paz como em tempo de guerra e, neste caso, eram regularmente utilizados na dieta dos guerrilheiros da UPA, organizados em células de comandos operacionais em zona de combate. Este termo operacional não tem a ver senão com a aprendizagem (desde muito cedo) referente à arte da caça aprendida precocemente pelos jovens kongo.

 
 
Em lugar de destaque, situa‑se o amendoim, a n’guba, no dizer kongo (os ataques da UPA começaram a 15 de Março com a colheita por fazer). Pouca gente sabe que o amendoim é um dos alimentos mais completos em nutrientes, proteínas, vitaminas, lípidos, carbo‑hidratos e sais minerais, de baixo custo e ao nosso alcance. O amendoim pode ser largamente aproveitado na alimentação, principalmente como suplemento proteico de qualidade. Além disso, é mais barato que outras proteínas como as castanhas, o leite, a carne e o queijo. É também um alimento funcional que pode actuar como inibidor do apetite.
Sabemos, existirem estudos científicos que comprovam os benéficos efeitos, após a ingestão de uma pequena porção de amendoim. Os níveis de saciedade elevam‑se e mantêm‑se por mais de duas horas, ou seja, mais do dobro da saciedade quando comparado com pequenas refeições hipocalóricas normalmente recomendadas em planos alimentares de redução de peso. Como refeição intercalar, entre as principais refeições do dia, desde que consumido com moderação, pode ser um saboroso aliado na manutenção de peso durante o Verão. Confirmámos tudo isto, quando de visita à diocese do Uíje, em 2005. Num aparador da sala de jantar, estavam sempre presentes e, à nossa disposição, dois ou três frascos com amendoim torrado. Fizemos questão de perguntar ao Sr Bispo D. Francisco da Mata Mourisca sobre o valor do amendoim e o mesmo confirmou‑nos o que atrás deixámos dito.
 
O mais tradicional de todos os alimentos é a célebre kikuangae tem como base a mandioca que depois de fermentada e muito bem amassada, é cozida e envolvida em folhas de bananeira. Trata‑se de uma espécie de ração de reserva em combate que, ocasionalmente se serve (quando o há) com o molho de óleo de palma. Os restantes alimentos básicos como cana‑de‑açúcar, gengibre, gindungo e kola eram igualmente fornecidos aos guerrilheiros pelo clã.

 

 
Como apontamento interessante, apresentamos acerca da fotografia de Margot Dias (1992:411), que ilustra o artigo “Nota sobre o Almofariz Horizontal da Província de Uíje, Angola”, a seguinte citação:
“(…) No caminho entre Damba e Maquela do Zombo, da povoação de Luaia para diante, o almofariz horizontal é o mais frequente. Encontrámo‑lo quase diante de cada casa, como igualmente, no dia seguinte, no caminho de Maquela do Zombo para Cuimba (…).”

 

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