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Portal da Damba e da História do Kongo

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Página de informação geral do Município da Damba e da história do Kongo


AS ORIGENS DO REINO DO KONGO (2)

Publicado por Muana Damba activado 21 Agosto 2012, 09:44am

Etiquetas: #História do Reino do Kongo

 

 

Por Patrício Cipriano Mampuya Batsikama


 

Batsikama

 

 

 

Descrição da Tradição Oral

 

 

Comecemos pela descrição da tradição oral. toda a tradição oral remete à língua, da qual se constitui e de cuja lógica comunicativa depende. Neste sentido, descreve-la significa tratar de linguística no seu sentido de logikê. Por outro lado, toda a língua é evolutiva, pois depende e acompanha fielmente o dinamismo e a dinâmica do povo-autor. Se, portanto, a língua permanece fiel à evolução da sociedade, por conseguinte a História exprime-se e imprime-se, de maneira espontânea, nas expressões orais, nas palavras e nos ditos, assim como nas expressões materiais. Razão pela qual o professor Edward Sapir considera a tradição ou, como prefere na sua terminologia, «os elementos da língua», como fonte histórica a menos corrupta30. No entanto, é também a mais difícil de extrair os seus inventários históricos por depender de escolhas, sempre complexas e complicadas ou, simplesmente, por questões de método específico. Por outro lado, estudiosos como luc de Heush procuraram a História dentro das essências esubstâncias semânticas/somáticas dos ritos e da cultura material, porque entenderam que assim se exteriorizam os sentimentos mais íntimos na Oralidade.

 

As palavras carregam os significados – populares, sapientes, figurados, etc., – e os sentidos daquilo que é conhecido e partilhado por todos, porque são convencionais. E, se por acaso alguém inventasse o seu vocabulário sem o partilhar com os outros, a fim de juntos chegarem a um consenso para convencionalizar morrerá junto com as suas invenções. Em contrapartida, as palavras não mentem a si próprias, a não ser que sejam mal interpretadas. A palavra banana nunca poderá designar outra fruta ainda que pronunciada por alguém que não seja especialista em botânica. uma coisa pode ter vários nomes ao longo da sua existência, mas será possível que nalgum momento desse tempo a primeira designação já não tenha a menor relação com a nova. todavia, como em todas as línguas, as palavras levam consigo sempre o património comunicativo de suas raízes, de tal modo que as palavras derivadas do primeiro nome e as palavras derivadas do último nome, por exemplo, continuarão a partilhar sempre alguma relação independentemente de como, onde e quando são articuladas nas frases (relações oracionais ou relações operacionais da comunicação). É aqui que reside a utilidade da diacronia e da sincronia34 no método paremiológico,que nós empregaremos ao longo desta obra.

 

Portanto, é impróprio considerar que as palavras, como meio de expressão, mintam ou enganem, a não ser que o investigador interprete mal as palavras ou compreenda incorrectamente a tradição oral envolvida.

 

Comecemos por sustentar o seguinte teorema, nº1: “Se a língua é convencional, a tradição também é; se a língua não mente, a tradição também não mente”. Para ilustrar, temos o seguinte exemplo de l. Souber- ge: «Quem são os teus avós? Os meus avós são o Sol de Ilunga (Kasai Ka Ilunga) e Hiena de Ilunga (Tshimbùngu Tsha Ilunga)»35.

 

Verifica-se logo que o Sol e a Hiena estão em paralelo. Mas, seguindo a lógica da tradição oral envolvida deveríamos ter sol e lua, ou hiena e paralelo com outro animal. Ocorre que o outro sentido de Kasai (Kasadi) como animal é desconhecido pelo autor. Parece-nos então que a ele terá faltado informações acrescidas sobre a tradição oral implicada, e o sentido das palavras empregadas. Portanto, ao decompor e recompor essa frase, ela reflecte as origens, pois o termo avós reenvia a ascendência.

 

Entretanto, tratar-se-ia da sociedade inteira, porque generaliza “avós”. Quanto aos nomes KASAI KA IlUNGA e TSHIMBUNGU TSHA IlUNGA, apresentam um denominador comum: Ilunga. Justificando os dois lados maternos e paternos do indivíduo, este denominador comum, pela sua função fraseológica e semântica, certificar-se-ia como alguma origem comum para a qual toda a sociedade pende. KASAI traduz-se em luz que o sol entorna no dia e a lua durante a noite. E, tshimbungu36, que segundo Souberge equivale a hiena, tem outros sentidos, como 1) explorador, 2) vento ou luz exploradora ou 3) animal explorador (hiena). De acordo com a cosmogonia Pende, na lua surge uma mulher com lenha na cabeça, um filho no dorso e um pequeno animal (hiena) ao lado. Desta maneira, Kasai significa sol e tshimbungu lua.

 

Assim é, por simples analogia frequente nas formas de falar37. Ou melhor, extensamente, o começo (luz de sol, luz de dia) e o fim (luz da lua, luz da noite). Quando os Pende explicam que são originários de um país chamado Kôla, ou até Mbângala (país de grandes calores), KASAI e TSHIMBUNGU confirmam semioticamente esta característica do país das origens.

 

Inevitavelmente, a análise da tradição Oral implica intervenção de um conhecimento suficiente geral sobre a sociedade em questão. talvez assim seja entendido o que observou o professor Ki-Zerbo acerca da tradição que deve ser apoiada por outra39 fonte. Como a História abarca vários domínios, a cronologia por exemplo, somente a língua será incapaz de “datar”. Por isso, será necessário confrontar com outras fontes. A esse respeito e falando dos Kyaka (umbûndu) cuja Historia seria fundamentalmente na base da tradição Oral (para os séculos que precedem o séc. XVIII), Mesquita Lima faz observar o seguinte: «será lícito duvidar dos dados que foram directamente recolhidos dos informadores da sociedade estudada? Deveremos aceitá-los como fidedignos? A estas interrogações, poderíamos responder com uma outra: quem, melhor, do que estes mesmos informadores, estaria capacitado para contar a sua própria História? Evidentemente, eles são arquivos vivos da sociedade, constituem uma espécie de memória colectiva ou, se quisermos, de palavra histórica. Não estamos perante dados escritos. Contudo, afirmarmos que esta memória implica uma certa ilusão da prática social não será menos verdade. Em todo o caso, os elementos fornecidos pelos informadores são preciosos, devendo, no entanto, ser confrontados40 com outros dados ainda que proveniente de outros informadores, em situações diferentes»41. Nota-se aqui que Mesquita lima prefere confrontar uma “tradição” com outra “tradição”, uma via ligeiramente diferente de “tradição” contra outro tipo de fontes, “Escrita” por exemplo (ou poderia ser antropológica, também). Pois parece termos a resposta a essa questão: o confronto da tradição com outras fontes não implicaria nenhuma exiguidade ingénita, pois a sua insuficiência no rigor científico, tal como as vezes acontece com as escritas: os relatos de Da Gallo e do Da lucca são sempre confrontados quando se fala de Ndona Beatriz42: o método critica histórica.

 

A confrontação dos dados é, na verdade, tradição em todas as ciências. Aliás, a epistemologia faz-nos entender que numa ciência se envolvem directa ou indirectamente todas as outras ciências para realmente constituir um conhecimento relativamente verificável (aprovado?).

 

O professor Ki-Zerbo parafraseia: «A comparação das Tradições, tomando conta das regras que presidem a sua evolução, PERMITE ASSIM ELIMINAR OU TIRAR E CONSERVAR SOMENTE AS FONTES MAIS

VÁLIDAS». Essa seria a problemática que conduziu quase todos cientistas sobre a História pré-colonial de África44. “CONSERVAR SOMENtE AS FONTES VÁlIDAS”, parece insinuar alguma intromissão do “investigador” nos dados. Embora seja por alguma falta de método, não se pode, em ciência, expor arbitrariamente uma opinião sem prévia análise. um químico que nega a “validade” de um elemento químico por não manusear os devidos métodos na sua posse só pode deste modo proclamar a sua incompetência como especialista, pois o elemento químico não deverá ser negado como tal. Exemplo; antes da invenção do telescópio, falar de outros planetas parecia loucura pelos génios da ciência dita astrologia. Ainda hoje com a evolução da ciência alguns planetas tornaram-se duvidosos. Da mesma maneira, parece faltar aqui os instrumentos para analisar a tradição oral45, o que não significa que esta tradição seja falsa ou inválida, mas reconhecer nela os seus problemas.

 

Uma corrente sem preconceito terá começado na época de Estermann (fundador do Institute dos Estudos Africanos na universidade de Bayreuth), Baumann, Westermann, Damann, DF Call, Persons, Deschamps, Werlesse, etc. Com eles levantam-se as convergências entre a tradição Oral e muitas Histórias escritas. Será por isso que Georges Balandier terá dito: «o negro também é homem»47? Essa “Era” contou com o “estruturalismo” como dispositivo metódico e como postura científica para os linguistas, os pós-malinowskianos, e os africanistas (acima enumerados e não só). A respeito da civilização/história do Kôngo apareceram, laman, Cuvelier, De Munck, Van Wing. E a posterior, Vansina48, Hilton, thornton, MacGaffey, entre outros ainda passaram a constituírem a bibliografia “obrigatória” sobre a civilização Kôngo.

 

Mesmo quando Jan Vansina assumiu a tradição Oral como História, apresentou a sua tese da forma seguinte: a tradição é: (1) informação, (2) interpretação da experiência, (3) história oral49. E, especialmente para “História Oral”, o autor sustenta: “the sources of Oral Historians are reminiscences, hearsay, or eyewitness accounts about events and situations which are contemporary; that is, which occurred during the lifetime of the informants. this differs from Oral tradition are no longer contemporary. the two situations typically are very different with regard to the collection of sources as well as with regard their analysis; oral historians typically interview participant in recent or very recent events, often of a dramatic nature, when historical consciousness in the communities

involved is still in flux”50.

 

A posição de Jan Vansina em relação a tradição Oral ainda oscila: “Some of them call this “immediate history”. Interview of this nature are always compared to available written or printed information. the goal is to save source from oblivion, to come to a first assessment of the events/situations studied andto promote consciousness among the actors of the happenings themselves”.

 

Como se pode notar, até o grande legitimador da tradição Oral como História, ainda apresenta “receios” sobre o facto da possível invalidade causada pelo facto da tradição ser: “(1) news, (2) eyeswitness, (3) hearsay (rumors) e (4) visions, dreams and hallucinations”52.

 

Mas o relato linhagético (tradição oral) obedece a uma estrutura que obedece a instrumentalização paremiológica sem necessidade de alguma intromissão do investigador nas recolhas.

 

Obs: Por tratar-se de uma obra literária histórica rica em notas explicativas e referenciais, que acompanha o texto e por razões de comodidade, renunciamos reeditâ-las neste portal. No entanto, aconselhamos os nossos visitantes, a adquirir o livro completo, publicado em volumes, na:


Mayamba Editora
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luanda-Sul Angola
Caixa Postal n.º 3462 – luanda
E-mail: mayambaeditora@yahoo.com

 


 

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