Tabonta: O músico inspirado Pelo choro do povo.
Publicado por Nkemo Sabay - Etiquetas: #Entrevistas
O músico Tabonta. (foto de J.A)
Muzemba Gilberto nasceu em 1951 na comuna de Camantambo, da Damba, província do Uíge. Aos 13 anos, Muzemba Gilberto deixa a localidade que o viu crescer e foi estudar no Congo Democrático por decisão dos pais. Em 1971, ano em se tornou acólito da congregação cristã católica “Santo Sacramento”, Tabonta foi integrado no grupo
coral. Por esta altura, começa a descobrir os dons que possuía.
Tabonta gostava de cantar em latim quando actuava no grupo coral, onde quase todas as músicas eram interpretadas nessa língua. O acólito decidiu fazer a transposição das melodias em latim para
kikongo. “Achava fascinante o latim e por isso veio-me à ideia transcrever os versos em latim para a língua da minha terra”, afirmou. Muzemba Gilberto nesta altura começa a ganhar amor pela
música e descobre que o dom de interpretar.
“Comecei a escrever canções e a cantar”. Nesta fase cria o nome artístico “Tabonta”, que na gíria angolana significa “Tás bom?”.
Passados alguns meses Tabonta forma o primeiro conjunto musical de que fez parte “Carnabuse”, “Lazenge” e angolanos que residiam no Congo Democrático. De regresso a Luanda, em 1977, um ano depois
integra o grupo “Emolução”, onde ficou pouco tempo devido a desentendimentos entre os integrantes da banda. Daí, passou por vários conjuntos, entre os quais o “Interpalanca”, ao lado de Mogue,
Teddy Nsingui, Clara Monteiro, Mayi, Double Baguette, Fely Nóa, Nanada Mulata, Nanda Preta, Tokodi e Ngandó.
Em 1979, altura em que o povo angolano chorava pela morte do Presidente Agostinho Neto, Tabonta recebeu uma proposta do cantor e compositor Matadidi Mário Bwana Kitoko, para homenagear o primeiro
Presidente de Angola. “Apenas numa noite, usei toda a minha criatividade para escrever a letra ao poeta maior. Senti-me com mais vontade ainda de escrever quando ia descendo o Quinaxixi e me
deparei com muitas pessoas a chorar. Foi um momento dramático”, sublinhou o cantor.
Neste mesmo ano grava o tema “Wele Neto o Tuna Yandi” de expressão kikongo, que em português significa “Neto morreu, mas está sempre connosco”.
Passou ainda pelo grupo “Instrumental 1º de Maio”, onde pela primeira vez se tornou assalariado. Como integrante do grupo, Tabonta realizou uma tournée pelas províncias.
Tabonta lançou recentemente no mercado nacional o primeiro disco com o tema: “Wele Neto o Tuna Yandi”, composto por 12 faixas interpretadas em kikongo, kimbundu, português, lingala e francês, nos
estilos kizomba, semba, zouk, salsa, slow, bolero, sukuse, rumba, e sikilu e kimbondo a base de estilos folclóricos da República Democrática do Congo.
No CD de homenagem a Agostinho Neto, constam músicas criadas e gravadas em 1970, entre os quais se destacam a canção que dá título ao disco (escrito em 1979), “Reconciliação Nacional”, feita em
1977, “Sou Órfão”, “Ilha de Luanda”, “Ngodiondo”, “Nguizani”, “Ngui Mona Di Fundu”, “Viva Angola”, “Guta Sasa Kiesse”, “Bom Aniversário”, Mayi Ma Zokoto, “Kibongi”, “Sou uma Roseira”, e “Kama
Mona Mosiko”, foram escritas em França pelo artista, durante a sua estada em Paris.
O repertório conta com a participação de músicos franceses, antilhanos e congoleses, alguns dos quais já actuaram na banda “Certeza de Paris”, com os artistas Franco, Koffi Olomide, Papá Wemba,
Awilo Longomba, Bozi Bobwana e Werra Som.
Entre eles constam Madoca, Olivier, Mavatiko Vicy, Maya, Félix, Paty Basse, Michel Basse, Fabrice, Double, Simolo e Patrícia Camaron.
Desentendimentos
Os desentendimentos no conjunto 1º de Maio levaram-no a uma suspensão de seis meses sem trabalhar e sem salário. Tabonta resolveu rescindir o contrato e partir para França em 1983.
Em França exerceu a profissão de decorador de interiores. Lá colaborou em vários discos de artistas congoleses e camaroneses, e em 1992, gravou e lançou um disco de vinil com seis faixas.
“Levei a minha mulher para vivermos em França. Passei por grandes dificuldades quando lá cheguei e mais ainda, pelo facto de ter deixado a minha filha de dois anos com a família em Luanda”,
disse.
Tabonta responde
A década de 1970 é considerada como a fase em que se evidenciou a Música Popular Angolana. Que recordações é que guarda desse tempo?
A década de 1070 foi o “tempo dos bons tempos”, como digo sempre aos meus amigos. Tenho saudades dos meus companheiros de banda, quando nos reuníamos para cantar e compor. Na
altura tinha um amigo e colega chamado Lusolo Garcia, conhecido pelos mais próximos como “Mogue” que anda desaparecido. Na altura em que deixámos de cantar juntos eu fui para França e mais tarde
ele também partiu para o estrangeiro e perdi completamente o contacto dele. Encontrei-me com a família e obtive informações que está nos EUA, mas nem a família nem os amigos sabem onde ele
reside. Aproveito a ocasião para apelar a quem tenha alguma informação, para me contactarem porque a família e amigos como eu precisamos de mais notícias.
Os artistas que se destacaram nessa época são hoje valorizados?
Ainda é pouco o que se tem feito pelos artistas que se destacaram nessa época. Quando nos reunimos debatemos sobre o assunto. Apesar de termos o Centro Recreativo Kilamba, precisamos de mais
espaços e empresários que apostem na nossa música. São necessários projectos ligados aos artistas de vanguarda. Se as nossas músicas são hoje cantadas e interpretas por artistas mais jovens,
também merecemos apoio por parte dos empresários. Somos mais velhos e temos pouco tempo de vida, não podemos esperar muito tempo como os jovens, por isso a nossa hora é agora!
Como avalia a nova geração de artistas?
Desde que regressei de Paris que notei uma mudança radical no mundo da música. Houve uma grande evolução que acho positiva. Isso deve-se às oportunidades que se dão aos novos artistas. Mas existe
uma deficiência nas letras que compõem. Ainda são poucos os que escrevem versos que resistam ao tempo e ficam na memória do povo. Hoje, os estilos musicais estão virados para a área comercial. E
devemos diferenciar os animadores e cantores, porque no mercado musical têm surgido muitos animadores que optam pela música imediata.
Quantos anos tem de carreira musical?
Tenho 35 anos de carreira musical. Sou pai de cinco filhos e mesmo com os meus 59 anos, mantenho a inspiração para compor as minhas músicas. Sou uma pessoa muito alegre e aproveito as boas coisas
que a vida me proporciona.
Jornal de Angola.