Por Dr José Carlos de Oliveira.
A Comerciante das Praças, no Comércio Tradicional Zombo (4)
As catorzinhas diferenciam‑se das outras mulheres apenas pela irresponsabilidade
de criar os filhos. Curiosamente, entendem que o normal é serem assim
e se não forem são ‘fora de série’. Durante a nossa estada
no Uíje visitamos uma paróquia em dia de festa a convite de um padre
católico. O ritmo da Kizomba era a dança‑base. Dança um pouco parada e fortemente sensual. Os jovens não passam sem ela, disse‑nos o
pároco, acrescentando que no final da festa ficam somente os jovens. As meninas que na catequese e na escola fogem dos rapazes acabam com alguma frequência
por aparecerem grávidas.
É aqui que a falta de uma educação que visa atenuar a grave situação em que vivem os
adolescentes se faz sentir. Nas condições que actualmente vivem os zombo, a educação da população feminina, no sentido lato, reveste‑se de importância talvez ainda maior do que da própria população masculina. Apesar da solução dos problemas de desenvolvimento depender em larga medida das mulheres, os progressos realizados em
prol da sua educação são visivelmente inferiores aos dos alcançados pelos varões. Algo funciona mal.
Todos os grupos etários das mulheres que acabámos de descrever continuam ligados às tradições e costumes ancestrais. Acrescente‑se o drama do flagelo das guerras de décadas e as
diversas estratégias operacionais encontradas para sobreviverem. Estão encontrados suficientes obstáculos ao desenvolvimento económico e ao bem‑estar
geral. Haja em vista as inúmeras interdições alimentares (ainda existentes) observadas não só pelas grávidas em relação aos fetos, como também pelas lactantes em relação aos recém‑nascidos. Não
restam dúvidas que a estas interdições mágico‑religiosas se aliam a carência de cuidados higiénicos e a ignorância sobre princípios nutritivos que resultam numa elevada mortalidade infantil.
Muitos pais fazem reais sacrifícios para sustentar os filhos varões durante os seus lentos progressos escolares. Mas poucos estão
dispostos a realizar os mesmos sacrifícios a favor das filhas. Ponderam que estas casem cedo e por isso não vale a pena estudarem. Além disso, uma boa
parte dos pais estão convencidos de que a instrução das filhas lhes diminuirá as oportunidades de conseguirem maridos satisfatórios. De facto, muitos homens não escondem o receio
de casarem com mulheres relativamente instruídas alegando que as suas exigências em matéria de vestuário,
ornamentos e confortos e, enfim, a sua menor submissão obediência são suficientes obstáculos à realização de
um enlace matrimonial. A elevação da educação da população feminina em escala significativa exigirá, por conseguinte, uma transformação radical da atitude
dos varões.
Sem dúvida que a menor escolarização das raparigas zombo contribui para o atraso da
população feminina em geral. Todavia não é razoável pretender que a maioria dos problemas sociais e económicos com que se debatem os zombo possam ser compreendidos e medidos pelos espíritos imaturos e sem experiência na vida adulta daquelas. Enquanto as mulheres estagnarem, toda a
comunidade se verá profundamente afectada no seu desenvolvimento. Os esforços oficiais em matéria de educação terão que tornar‑se muito mais eficazes. Por exemplo, o
conhecimento do português no ensino primário é fundamental, é necessário que saibam ler e escrever o suficiente
para puderem cumprir com dignidade as duríssimas tarefas que lhes estão designadas.