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Portal da Damba e da História do Kongo

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Página de informação geral do Município da Damba e da história do Kongo


Os Heróis civilizadores e o calendário da fundação

Publicado por Muana Damba activado 30 Septiembre 2013, 01:55am

Etiquetas: #História do Reino do Kongo

 

 

Por Patrício Cipriano Mampuya Batsikama

 

 

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Os 27 heróis civilizadores Kôngo, os 27 heróis civilizadores Kôngo, 11 estariam na base da fundação das estruturas institucionais do reino. Pode-se acompanhar a evolução cronológica dessa fundação através da vida e obra desses heróis. No entanto, faremos isto apenas como tentativa de positivar os registos da Tradição Oral, quer aqueles que já existiam antes de nós, quer aqueles por nós colhidos nesta investigação.

 

Mais acima citamos as seguintes tradições registadas por R. Mais acima citamos as seguintes tradições registadas por R. Batsikama.

 

1ª - Ne Kyângala, nkwa mpu makumatatu zakondwa Tatu. : Ne Kyângala, isto é, Sua Majestade Rei do Kôngo, cujo poder é um jogo de trinta coroas menos três;

 

2°- Kuna Kôngo-dya-Mpângala, (tûku dya) nzûndu mavwa matatu, : no Kôngo-dya-Mpângala a origem de nove vezes três bigornas ;

 

- Kongo dina ñwângu mavwa matatu: dina ñwângu mavwa matatu: O Kôngo, este país cujo poder é constituído por nove vezes três argolas; 

 

4ª - Mbânda, Na Kôngo, wabandakana mavwa matatu ma ñlûnga vana Wêne wa Kôngo: Mbânda, o soberano do Kôngo, que leva as nove vezes três argolas da Majestade do reino.

 

Se partimos do pressuposto de que Mbangala marca o início em termos do tempo do calendário Kôngo, seria óbvio que ele demarque, também, o início de cada época entre os 27 heróis civilizadores. Virgílio Coelho dá-nos o exemplo de que Mbângala, entre os Ambûndu, marca o “país dos primeiros ancestrais”. Isto reforça este sentido de “início temporal” de Mbângala. Do mesmo modo, assim como reza a Tradição, as novas autoridades foram empossadas durante o período de Mbângala, como símbolo de fidelidade aos ancestrais. Mas, tendo em conta as particularidades possíveis que vão desde a morte de uma autoridade e a entronização de um novo líder, acontece que Mbângala pode comportar mais de um mbângala. É por esta razão, talvez, que foram necessários três mbângala para definir a passagem de uma autoridade para o seu sucessor. Logo, quantos mbângala se terão passado na sucessão dos 27 heróis civilizadores? Vamos tentar descobrir.

 

De Nkûndi (Mpângi) para Nânga são geralmente 3 mbângala; de Nânga para Nkându são 6 mbângala; de nkându para Nkângu são 9 mbângala. Parece largamente justificado que, de acordo com o quadro do primeiro estudo, nessa altura será institucionalizada a cultura da solidariedade: Primeiro a amizade entre várias famílias (lûnda), de uma forma tal que com nkângu notar-se-á uma elevação de amizade-entre-famílias com base nalguns princípios: nsiku, pacto que não se rompe e caso o seja, resultando em punição do transgressor. É desta forma que muito provavelmente terá nascido a idéia de país (nsi = nsîku), de país (nsi = nsîku18), no sentido de aparelho administrativo. Até hoje, na linguagem kôngo corrente nkângu hoje, na linguagem kôngo corrente nkângu19 é a expressão que indica o acordo de várias pessoas que, uma vez feito, são altamente proibidas de desfaze-lo (nsîku = nsi). Do mesmo modo, nkângu era a expressão que geralmente referia o tempo exigido para uma viúva ou viúvo
contrair novo matrimónio. Assim se diz que “já passou o nkângu dela ou dele”, ou ainda que a “dikânga dele/dela expirou-se”, etc.

Com o tempo consolidou-se um conceito entre as noções de nove (vwa) e de país (nsi) para representar a solidariedade-de-amizades-entre-famílias, que é nkângu, isto é, um conjunto de nove mbângala que viria a estipular a ideia de tempo de transição necessário para a entronização de novo líder. Terá sido assim que esse espaço temporal de nove mbângala passou a padronizar a sucessão de toda a autoridade.

No primeiro grupo são, a princípio, nove Mbângala. De Nkênge até Makândala parece ter havido nove mbangala; de Makândala até Mpânzu’a Nsi seriam, também, 9 mbângala; de Mpânzu’a Nsî até Mata (Kôngo) também são 9 mbângala. Até ao 26º herói são geralmente 9 mbângala de intervalo entre cada um. Assim, descontado os primeiros 9, teriam sido no total 174 mbângala. De uma forma geral, e desta vez adicionados os 9 outros mbângala, teriamos 183 mbângala no total.

 

Se partirmos do pressuposto de que dois mbângala valem um ano romano, os 183 mbângala farão 91 anos e meio. Partindo da premissa de que 27 herois civilizadores, considerados pela Tradição como “metalinguagem do tempo que levou a civilização kôngo”, fica claro que seriam largamente insuficientes para que – como o notou Cavazzi – os Estados federativos Mbângala, Mulaza e Lwângu tivessem sido centralizados pela cidade de Mbânza-Kôngo. Vamos tentar aclarar a obra dos 27 herois civilizadores que durante 183 mbângala fundaram 144 comunas do reino do Kôngo, que vimos no primeiro capítulo.

Os 183 mbângala foram institucionalizados em 144 comunas do reino do Kôngo.  comunas do reino do Kôngo.20 O número dos Mbângala é o mesmo das comunas. Isto quer fundamentalmente dizer que cada comuna Kôngo foi criado num só mbângala. E, tendo em conta que o equivalente normal de mbângala é nove, pode-se sugerir a hipótese de cerca de 1647 anos de fundação do reino do Kôngo (183x9 = 1647 anos).

O reino do Kôngo, tal como foi apresentado ao mundo desde Filippo Pigafetta e Duarte lopez, compreende 39 comunas, embora estas tenham sido apresentadas com sérias deficiências que já demonstramos anteriormente. A própria Tradição menciona 27 argolas (comunas) centrais, olvidando aparentemente as doze comunas da região de Mpêmba, uma vêz que toda província ficava sob mando directo de Mani Kôngo e não de Mani Mpêmba que, na verdade, era apenas uma autoridade religiosa auxiliando o rei e o consagrador deste (ver o capítulo I da primeira parte).

Acontece que desde Pigafetta, o Kôngo sempre foi reduzido ao Zita-dya-Nza. Além disto seis províncias são confundidas com territórios, comunas e distritos. Exemplo: Nsôyo foi elevado à província quando na realidade era apenas uma comuna; Mpêmba foi correctamente considerado província, mas comparado com Nsûndi e Mpângu como províncias, quando na verdade esta última era apenas um território fronteiriço.

Numa primeira instância a Tradição apresenta 144 comunas/mbângala, que se traduzem por 144 x 9, que equivalem a 1296 anos de fundação. Isso quer dizer que, com base na Tradição a fundação do reino do Kôngo teria uma duração aproximada de 1296 anos para sua concretização. Mas, se partirmos do reino do Kôngo apresentado por lopez e Pigafetta teríamos 39 comunas/mbângala, que equivaleriam a 351 anos de fundação. É com base neste último dado que historiadores acreditam que o reino do Kôngo terá sido fundado entre os séculos IX e XI, e que terão se passado apenas três séculos e meio (ou 35 anos?) para que Nzîng’a Nkuwu reinasse (e fosse contactado pelos Portugueses).

Com relação às 183 (possíveis) comunas de todo o reino do Kôngo, alguns factos são igualmente notáveis. Ao ler baumann e Westermann, por exemplo, deparamos com 13 ou 14 tribos do Kôngo-dya-Mpângala que Raphaël batsîkama tentou reorganizar em 12 territórios, isto é, 12 x 3 = 36 comunas da província. Para este último estudioso, seriam na verdade quatro províncias: (1) Kôngo-dya-Mpângala, (2) Kôngo-dya-Mulaza, (3) Kôngo-dya-Mpânzu e (4) Zita-dya-Nza. Ao multiplicar o número de comunas (36) pelo número de províncias (4), serão 144 comunas de todo o reino do Kôngo. Ora, de acordo com a organização territorial conhecida faltariam cerca de 39 comunas que a Tradição Oral não enumera por pertencerem a uma ordem religiosa, que são os Mpêmba de todas circunscrições .

Como podemos notar: Mbângala é um “espaço temporal”, e ao mesmo tempo “unidade territorial: comuna”. Em primeiro lugar, os 27 heróis da fundação do reino do Kôngo ilustram a calendarização estabelecida espontaneamente na instalação das 144 prováveis comunas. Mas levando em conta a peculiaridade de mbângala, à qual os 27 heróis parecem corresponder, as comunas podem ser consideradas como redimensões de “trinta menos três argolas”, como parece sugerir a própria Tradição Oral.

1) Calendarização. De acordo com a semântica que recobre cada patrónimo de herói civilizador, não nos parece seguro optar pela sequência mecânica: Há probabilidade que a sua contagem que obedece a lógica tripartida estaria em paralelo com a diacronia dos 27 heróis civilizadores. Desse olhar dialéctico entre lógica tripartida e diacrónica dos civilizadores, desenha-se (como veremos) um calendário estruturante. Mas essa calendarização só se justificaria para todo o país, e jamais com uma unidade provincial de 36 comunas apenas: (i) “27 heróis” é canónico para o “país inteiro”; (ii) “três Estados federativos do Kôngo” estruturaram as “144 comunas”; (iii) as “183 comunas” são realizadas em “91 mbângala”; (iv) “27 heróis” são equivalente temporal de “91 mbângala” e codificam o processo da fundação do país na íntegra.

2) Redimensões: Os mbângala como espaço temporal parecem reduzir o espaço temporal da fundação paralela e/ou progressiva de 36x4 = 144 comunas. Tal como já avançamos no primeiro capítulo, as 36 comunas consideradas como a totalidade territorial de uma província não podem equivaler as 27 argolas de todo país (não obstante a confusão). Numa perspectiva matemática seriam 12 mbângala (3x4 províncias) a equivaler-se com a fundação do reino do Kôngo, de tal modo que os restantes 15 poderiam ser: (i) ou os primeiros reis da actual Mbânza-Kôngo, que aparentemente terão organizado as instituições sociais sob a influência dos costumes das suas regiões de origem, nomeadamente Mbângala, Mulaza, e Mpânzu; (ii) ou monarcas cuja instalação em Mbânza-Kôngo seria associada às novas instituições políticas em contraste com a realidade e circunstâncias, tal como sugerem as suas próprias semânticas.

Se partirmos do pressuposto de que seriam os 12 heróis civilizadores a estabelecer o reino do Kôngo, teremos 15 outros heróis cuja função terá de ser compreendida unicamente a partir de Mbânz’a Kôngo em relação às 4 províncias (inclusive aquela onde se localiza a capital). Seria por esta razão que se pensa que o “actual Mbânz’a Kôngo é origem de todos os bakôngo”. Sabe-se que de acordo com a tradição cada herói é uma incorporação de sete antecessores. alguns destes heróis civilizadores tendo sido já registados por autores anteriores, quer sob forma de “história de clã”, quer ainda sob outras formas. quer ainda sob outras formas.23 Contudo, podemos encontrar uma excelente explicação sobre os 12 heróis que sucederam os primeiros 12 heróis. Os primeiros 12 terão estabelecido Mbânza-Kôngo, tal como se diz de Ma lwâla na literatura. como se diz de Ma lwâla na literatura. O segundo grupo de 12 vem “ressuscitar” o que os primeiros 12 fizeram, tal como reza a Tradição oral: na consolidação de uma co-federação entre as partes, nomeadamente Ntono, Nkoyo e Mpânda, estes constituem um bloco de exploradores; Kyâla moko, Nsôna e Mfûmu constituem o bloco de democratização e desordens federalistas; Nkuwu, Buduku e Mankunku e, finalmente, Ntôtila, Ntinu e Mani que vem estabelecer o bloco dos reunificadores das partes.

Como podemos ver, estes blocos são quatro e curiosamente cada um leva o nome de um dia da semana kôngo, começando por Nkoyo do primeiro bloco, Nsôna do segundo bloco, Buduku do terceiro e finalmente Ntinu que tem um dos sentidos de Ntono.

Nkoyo: Para a maioria dos Kôngo, a semana começa com Nkôyo que considera como Domingo, primeiro dia sagrado. “Nkôyi tem algo em comum com fome e estiagem. Aliás, Nkôyi significa o facto mágico de impedir a chuva de cair”.  omo podemos ver a série de heróis imortalizados pelo dia Nkoyo lembra, por um lado, o Kôngo dya Mbângala como região de grande calor e, por outro, lembra o mbângala como espaço temporal de veneração dos ancestrais.

Nsona: Correspondendo ao Domingo do calendário romano, é o dia sagrado reservado ao culto dos ancestrais. Os sentidos de nsona, kyâla moko e mfumu se aproximam, tal como já vimos no primeiro estudo. Corresponde à institucionalização de amizades e as primeiras bases da democracia (eleição). “O sentido de sôna/designado por alguém, assim como na mesma ordem de ideias, sônana/estar sentado de forma cerimonial, são formas figuradas para dizer que o responsável do mercado foi eleito (sôna/ser eleito) com o fim de comandar”.

 

Buduka: “O verbo dûka, que traduz impedir, fechar, prevenir, cortar o caminho, etc., é um elemento entimemático bastante suficiente para entendermos que se trata de autoridade legalizada por Nsâku Ne Vûnda”. legalizada por Nsâku Ne Vûnda”.  Essa autoridade intervém na unificação dos federalistas secessionistas. 

 

Ntinu: Como equivalente de dia, aproxima-se de Nkênge. Lembramos que são três os designativos para o rei/monarca - ñtotila, ntinu e mani, e a Tradição apoia essa hipótese. «Nkênge, nguti’amfumu», nguti’amfumu», diz a tradição, que traduzida é: «Nkênge, a Mãe das Autoridades». E ainda «Nkênge, songo’a nene wulungila meso, ka ntambi ko»,ka ntambi ko», isto é, “Mkênge é uma montanha enorme da qual só pode circular o olhar e não os pés”. Essa palavra não só aglutina os três títulos de monarca, como também relaciona-se com a colina de Mbânza-Kôngo.

Importa ressaltar que os dias da semana – para além de imortalizar os factos dum passado milenar – apresentam a ordem dos heróis civilizadores fundadores do reino do Kôngo: (1) Nkoyo/Domingo; (2) Nsona/Segunda-feira; (3) buduku/Terça-feira e (4) Nkênge/quarta-feira. Eles corresponderiam a noção de semana no calendário da fundação do reino do Kôngo.

Tentaremos agora definir a divisão anual da fundação do reino do Kôngo, partindo do pressuposto inicial de que mbângala marca não só um espaço temporal, mas também a transição de diferentes épocas.

Com efeito, em Nkoyo, como o primeiro dia da fundação, estão envolvidos outros sub-dias. Assim faria sentido o que sustentamos anteriormente: a dimensão temporal de semana com quatro dias, de maneira que teríamos como totalidade 16 dias.

Supondo que pretendamos enquadrar esses dias nos cinco meses kôngo, qual seria o procedimento? quais serão, nesse caso, os critérios a definir para interpretar a duração de mbângala entre estes meses como metron, isto é, como unidade de medida?

E, ainda, qual seria a lógica definicional congruente entre o que é tipicamente kôngo e que é hoje geralmente conhecido?

Comecemos por enquadrar esses dias nos meses kôngo:

Kintômbo: A duração normal deste período não é compatível com um só dia de fundação (3 mbângala);

Kyânza: Um só dia de fundação ultrapassa em termos de duração temporal todo o período de Kyânza;

Ndolo: A duração deste período é demasiado inferior a duração de um só dia de enculturação (fundação);

Kisivu: Como é o caso do resto, como período o kisivu é insuficientemente inferior a duração do dia civilizador.

Face a estes problemas, como enquadrar então os meses agrícolas nos dias civilizadores? Talvez devamos reconsiderar as noções que lhes definem separadamente. Ou, optarmos por buscar os pontos definidores semelhantes como forma de estabelecer a distribuição temporal de um mbângala, uma vez que já dispomos de informações reveladores sobre o termo e a realidade que implica.

Acerca de mbângala, podemos diferenciar (i) mbângala de fundação; (ii) mbângala de reinado; (iii) e mbângala de intervalo entre o falecido rei e seu sucessor. quando a Tradição conclama que kuna Mbângala atûkidi Ambûta (é do Mbângala que se originaram os Ancestrais), os três sentidos de mbângala estão abarcados.

Mas por enquanto interessa-nos o mbângala da fundação e deixaremos propositadamente os demais mbângala para abordagem em estudos posteriores. A ideia principal é que nesse termo encontram-se misturados os seguintes sentidos: (i) arcaico e moderno; (ii) temporal e atemporal; (iii) sazonal e anual; (iv) secular/temporal e religioso/cosmológico; etc. Disto trataremos num próximo estudo sob o tema As doze nascentes fluviais de Mbânza-Kôngo.

Mbângala designa genericamente um período indeterminado que, no entanto, pode ser medido se ele for bem especificado dentro da narração (Tradição). Como o leitor terá notado, apenas tentamos reconstruir alguns elementos da mensuração temporal kôngo, mas ainda faltam vários outros elementos nucleares para especificar a sua equivalência na forma romana de contar o tempo.

Isso dependerá evidentemente de outras pesquisas sobre o “tempo agrícola”, “tempo religioso”, “tempo histórico” entre os Kôngo. O calendário kôngo informa sobre a variedade temporal da fundação. Os termos utilizados parecem ser um esforço de “imortalização” dos espaços conquistados, assim como os problemas de regulação e coesão das terras conquistadas e em conquista. Partindo desta ordem, podemos provisoriamente chegar a alguma conclusão, como segue.

Se nos basearmos na Tradição, seriam 144 mbângala/comunas que equivalem a 1296 anos de fundação; e se nos fundamentarmos no espaço definido por lopez/Pigafetta, seriam 39 comunas/mbângala (do Zita dya Nza) que equivalem a 351 anos, o que levou esses autores remontar ao século X/XI como data da fundação do reino do Kôngo. Embora com muita debilidade na  tentativa de compreender o calendário Kôngo, e encontrarmos o seu equivalente em relação ao calendário ocidental, ao institucionalizarmos a comuna kôngo como mbângala da sua fundação teremos no total 183 mbângala, que equivaleriam aproximadamente a 1647 anos como a duração do tempo de fundação do reino do Kôngo.

Qual seria, então, a data da fundação do reino do Kôngo com base neste argumento? A resposta para esta pergunta dependerá de outros dados cuja plataforma cognoscitiva ainda é virgem, como a arqueologia por exemplo. Mas podemos avançar – desde já – que no primeiro volume deste estudo (As origens do reino do Kôngo) vimos que de acordo com as Tradições recolhidas nas duas margens da foz do rio Mwânza as habitações (povoações) teriam precedido a aparição do rio. E, de acordo com os geólogos, existe uma “Era dos rios nascendo” que nas zonas centrais da África dataria entre I e II séculos da nossa Era34. Partindo deste pressuposto, duas acepções encaixam-se de forma surpreendente: (a) 1647 anos de fundação, partindo de uma data conhecida que é 1482, podem-se remontar até 165 antes de Cristo. Essa data combinaria com os cálculos de Cabordno feitos por J. Colette (1923-1924), e mais tarde por P. Maquet (1974), seguindo a mesma metodologia. Isto significa que o processo da fundação do reino do Kôngo teria chegado nas zonas que ocupam actualmente aí por volta de II séculos antes da Era Cristã. Neste caso, não só 183 mbângala/144 comunas estereotipadas pela Tradição como o “tempo que terá durado a fundação” parecem aqui sustentados pela geologia, mas também pela arqueologia: alguns utensílios domésticos datam do século II e III antes de Cristo; Cristo35; (b) apoiando-se nas listas da versão religiosa (mesmo que se respeite o tempo atribuído a cada reinado), deparamos curiosamente com “320 da Era de Peixe” como demarcação da fundação do reino do Kôngo nos arredores dos rios Kwându, Kunene, Kubângu (bravangulu/Okavângu), etc. Curiosamente, também, a presença humana (principalmente o contacto entre os Khoisan e os zimbabweyanos) dataria entre os séculos III antes do Cristo e II depois de Cristo, de acordo com a obra História Geral da África Cristo; e os documentos existentes nos museus da Namíbia e Cidade do Cabo (África do Sul).

Para explicar, podemos avançar o seguinte:

 

1) Visto que as populações Kôngo que habitam as regiões banhadas pelos rios Mwânza, Kwânza e Kwângu constituem uma unidade social, política e linguística que parece legitimar a ocupação das regiões antes do surgimento desses rios, podemos admitir a possibilidade de que as populações Kôngo tenham de facto chegado nessas regiões antes da “Era dos rios nascendo”;

 

2) Dado que o calendário Kôngo parece antropomorfizar os 27 heróis que diacronicamente participaram na fundação do reino do Kongo desde os primórdios, num total de 144 “pequenos nsi/países” que no conjunto constituem a evolução histórica da criação do reino do Kôngo, o tempo de fundação seria equivalente a 1647 do calendário romano. E se partirmos da data de 1482 (data do Diogo Cão descobrir o rio Mwânza), remontaremos até ao ano 185 antes de Cristo (século II antes de Cristo);

3) Dado que as versões religiosas enumeram uma longa lista dos reis antes da chegada de Diogo Cão, elas se baseariam provavelmente em vários suportes arqueológicos encontrados na região de Kuvângu/Okavângu/bravangulu – o que é razoavelmente confirmada pela arqueologia – que as faria remontar pelo menos até o século IV da nossa Era (veja o capítulo anterior).

4) A datação por Carbono 14 situa a existência de artefactos da civilização zimbabweyana, e outros utensílios presumivelmente utilizados pelos povos que ainda ocupam o actual espaço do Mbânza-Kôngo, entre os séculos II antes de Cristo e VII depois de Cristo.

 

Concluimos, pois, que a fundação do reino do Kôngo terá iniciado no Sul de Angola, especificamente nas regiões do rio Zambeze, entre os séculos III antes de Cristo e muito provavelmente terminaria nas regiões do rio Kôngo (Mwânza) entre o século II depois de Cristo. Mesmo depois de povo ter-se já instalado, os movimentos de instalação teriam continuado entre as populações irmãs até virtualmente a época da descoberta/ocupação lusitana do actual território de Angola.

 

 

 

Extrato do Livro: As origens meridional do Reino do Kongo

 

 

 

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