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Portal da Damba e da História do Kongo

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Página de informação geral do Município da Damba e da história do Kongo


Noções de Calendário: o Mês Kôngo

Publicado por Muana Damba activado 23 Septiembre 2013, 12:59pm

Etiquetas: #História do Reino do Kongo

 

 

Por Patrício Cipriano Mampuya Batsikama


 

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Na astrologia mês corresponde ao “período lunar básico, reconciliado nas sequências de doze por referência ao ciclo solar de cada ano”. Entre os Kôngo duas grandes estações (mvula e sivu), divididas em cinco pequenas estações climáticas que equiparam a noção de meses, e juntas constituem o “ano”. Vamos tentar descrever cada uma delas em consonância com a maioria das versões Kôngo:

1) Kitômbo (Outubro-Dezembro): compreende a micro estação das primeiras chuvas, também chamada sânza, na qual se realiza a plantação das sementes, e pertence a macro estação mvûla;

 
2)  Kyânza (Janeiro-Fevereiro): também situado na macro estação da chuva (mvûla), compreende a micro estação na qual alguma plantação derradeira pode ser feita, mas essencialmente dedicada à recolha do vinho de palma, o malavu, e por isto mesmo também chamado de mwânga.

3) Ndôlo (a partir da terceira semana de Maio): período das últimas chuvas que marcam a transição para a outra grande estação climática,  sivu. Integra tanto a estação  mvula quanto a  sivu, podendo ainda ser considerado como não pertencendo a nenhuma destas macro estações.

4)  Sivu (Maio-Agosto): caracterizada pelos ventos frescos, compreende o início da macro estação com o mesmo nome. As noites e as madrugadas são geralmente marcadas pelas brumas frescas.

5)  Mbângala (mi-Agosto/mi-Outubro): período de muita frescura, mas notam-se aqui os primeiros calores (myânza) provocados pelas queimadas dos campos, e também pelo sol geralmente muito ardente. O periodo é caracterizado também pelo frequente uso do “fogo” as noites, prática chamada de kôla.

 

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Kitômbo e  Kyânza constituem a estação  mvûla, e esta é marcada pelas chuvas;  Sivu e  Mbângala marcam a estação chamada kisivu. Voltamos a considerar cada uma delas:

1) Kitômbo: começa geralmente com as primeiras chuvas imprevistas que se apresentam na terceira ou última semana de Outubro. Nos Ambûndu por exemplo, o “Kutanu” (estação de chuva) começa nos finais de Outubro ou quase princípio de Novembro. Se remontarmos nas descrições de  Cavazzi e Cadornega, que são copiosas, sem olvidar os relatos de outros Padres, veremos que as chuvas são assinaladas quase sempre em Novembro, logo no princípio. Fizemos uma análise das chuvas que cairam em  Angola entre 1990 e 2000 com as seguintes conclusões: nas zonas de Norte (Cabînda,  uige e  Zaire) as chuvas começam entre 16-23 de Outubro; no Centro (bengo, os dois Kwânza) começam entre 30 de Outubro e 17 de Novembro; nas regiões do Sul as chuvas são tardias, geralmente no fim de Novembro e princípio de Dezembro e prolongam-se até Maio; nas zonas do leste o quadro assemelha-se ao Norte e Centro,
mas com muitas irregularidades: há chuvas que começam no princípio de Outubro, e uma quase ausência de chuvas nas semanas consideradas como começo “real” da estação chuvosa entre os Ambûndu. No entanto, quando a região meridional começa a acolher chuvas, começa ipso facto os grandes serenos nas zonas orientais. Mas com irregularidades consideráveis.

2) Kyânza: começa no final de Janeiro. Nota-se em quase todo território angolano a ausência das chuvas no fim mês de Janeiro, o aparecimento dum Sol ardente e as populações acreditam tratar-se do “Sol secador das terras”, uma vez precedido pelas (primeiras) chuvas impetuosas e imprevistas. Os Ambûndu e os Côkwe chamam a essa pausa de chuvas de Kyângala porque é marcada pela presença de sol ardente. logo no início de Fevereiro (entre os dias 3 e 10) regista-se muitas chuvas em quase todas zonas angolanas acima referidas e prolongam-se até Maio (entre a segunda e a terceira semana). Há, de certo modo, irregularidades em termos de data, que sempre variam. Mas as características dessas chuvas são quase uniformes: chuvas torrenciais que chegam a durar todas as noites ou dias inteiros, chuvas com precipitações, chuvas que provocam ravinas e imensos buracos no solo. Contudo, a periodicidade é extremamente irregular.

 

3) Ndolo é geralmente um período resumido, caracterizado pelas últimas chuvas. São chamadas últimas por não serem torrenciais e, parecerem demasiado efémeras e fracas, principalmente fragmentais. Pode chover um pouco no princípio do dia e voltar à chover novamente durante um tempo do dia e assim sucessivamente. Diz-se que tais fenómenos findam normalmente até dia 15 de Maio, mas nem sempre é assim. Há presença dessas “chuvas miudinhas” até Julho, pelo menos duas ou três vezes por mês.

4)  Kasivu (ou  Kisibu): começa canonicamente no dia 15 de Maio, o que não deixa de ser por influência da calendarização ocidental. Este período caracteriza-se pelos ventos frios a noite e de madrugada nas zonas do centro, razão pela qual masiku e masika passaram a ser sinónimos de “kyôzi” (frio), embora aqueles  designem dois períodos diferentes (crepúsculo e madrugada).

O  kasivu meridional é longo, embora com um “único” chuvisco efémero em Agosto. Normalmente essas chuvinhas marcam a transição entre o “grande frio” e o “pequeno frio” com a presença de sol suave. Costuma registar-se algumas chuvinhas nos mesmos períodos nas regiões de Malanje e lwena, na zona oriental.

 

5) Mbângala: esse período começa normalmente em Julho e prolonga-se até o princípio de Setembro. Depois dos pequenos calores que aquecem as baixas temperaturas de sivu, já na terceira ou quarta semana de Julho verifica-se a permanência do sol e a quase ausência do ar fresco. As duas primeiras semanas de Agosto ainda são frescas, mas o sol aparece de forma permanente nas duas últimas. Tradicionalmente as primeiras colheitas de frutas nesse periodo são “mbângala”, isto é, consideradas como primícias de Nzâmbi, e não como resultados de esforço humano. Ku-yângala significa “trabalhar e esforçar-se muito, mas em vão”. Nesse período se planta também a mulembeira (nsânda) para celebrar
uma espécie de (re)fundação duma nova aldeia, mesmo para as antigas aldeias. Nesse período realiza-se também o grande culto dos ancestrais, tal como registam os padres que escreveram a história de Chimpa Vita. É durante esse período que as práticas litúrgicas pagãs ligadas aos ancestrais dos Kôngo tinham lugar.

Aliás os antonistas, sob a liderança de Chimpa Vita, esperavam este período para restabelecer um rei que fosse eleito conforme as leis do Kôngo, justamente porque Mbângala marca o começo e o recomeço de tudo. É, tal como dissemos, a época em que se celebra os ritos dos ancestrais para reconfirmar o pacto (nsiku) entre os vivos e os mortos entre os Kôngo, os Ambûndu (nas suas preces referem Mbângala) e os Kwanyâma.

Devemos contudo reconhecer que prevalece ainda certa carência de dados complementares sobre a divisão de tempo entre os Kongo.

Aliás, esse impasse também foi assinalado no século XVI por Duarte Lopez, que informara Pigafetta de que os Kôngo medem o tempo com as luas e “não sabem as horas do dia nem da noite; e soem dizer: no tempo de Foão aconteceu tal caso”. Mas podemos concluir todas estas observações com uma marcante citação de Ki-Zerbo:

 

A falta da literatura histórica [escrita] não cria lacuna grave na História da  África negra. De facto, é através do
tempo que o Homem faz história. E, o historiador que quer reconstruir o passado sem repertório cronológico parece ao um motorista que roda numa viatura sem indicações kilométricas. Ora, tentando reconstruir uma cronologia em África negra, constata-se que séculos inteiros, imediatamente antes ou logo depois o nascimento de Cristo, não contêm indicações cronológicas. As datas são muito raras que a cada vez que
encontramos uma, ergue-se um monumento histórico. Mas a escassez [da cronologia] não pode fazer crer que os Africanos não tinham nenhuma ideia da cronologia.

 

Com essa declaração, o professor Joseph Ki-Zerbo afirmava que os Africanos tinham noção da cronologia, tal como os Kôngo o evidenciam na sua cosmovisão histórica.

 

 

Extrato do livro: A origem meridional do Reino do Kongo

 

 


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