Viagem ao BEMBE e DAMBA (8).
Por José Cardoso - Governador do Distrito do Congo, em 1912
Os Muxicongos
Em tempos não muito remotos, usavam os muxicongos das cercanias do Bembe ir negociar ao Ambris com malaquite extraída por eles das minas hoje em poder do Estado. Depois, eles próprios trabalharam nas minas por conta da Companhia inglesa que iniciou a sua exploração industrial. Serviam também como carregadores no transporte do minério para a costa.
Há poucos anos estiveram alguns comerciantes estabelecidos no Bembe, ocupando as ruínas dos edifícios em alvenaria construídos durante o período da primeira ocupação; não tinham, porém, com o fim de negociar com o gentio da região, por isso que ela não é rica em géneros de permuta que pagassem o seu transporte para a costa à custa do negociante. O estabelecimento do negócio europeu, ali, era movido apenas por uma razão de estratégia comercial.
Pretendia-se apanhar o comércio que do Zombo, Pombo e Sosso se dirigia para a costa, e nada mais. Não pôde porém , essa posição lutar com Maquela do Zombo, cujos negociantes efectuaram a ocupação comercial um pouco antes que nós realizássemos a ocupação militar.
O muxicongo da região que percorremos vive hoje, principalmente, de dar pousada e alimento às caravanas de negócio que trilham os caminhos do Bembe, sendo lucrativo explorar esses indígenas que chegam a alongar de 5 e 6 meses as suas viagens da Damba para a costa, viagem que fiz em onze dias …Essa demora é motivada por os carregadores se deixarem ficar durante tempos esquecidos, na bebedeira e na conversa, em todos os povos que vão atravessando.…
Os muxicongos diferem o bastante dos mussorongos para se distinguirem deles à primeira vista pelo seu aspecto exterior: Mesmo o viajante mais despreocupado compreende facilmente a transição de uma para a outra das tribos.
Tem o muxicongo menor estatura que o mussorongo e um aspecto geral mais miserável, já porque é menos robusto, já porque é mais sujo e pior trajado do que aquele. Tem uma apresentação humilde que contrasta com a aparência altiva do mussorongo , e uma fisionomia denunciando menor agudeza de espírito. Há todavia bons tipos de muxicongos nos arredores de Noqui.
Outra característica de fácil distinção entre mussorongos é dada pelo exame dos dentes. Quase todos os muxicongos limam todos os dentes superiores da frente, dando-lhes uma forma aguçada, enquanto que os mussorongos que limam os dentes, que hoje são já raros, usam limar apenas os dois incisivos superiores centrais, formando um bordo convexo regular, deixando aos lados de cada um dos dentes limados um ressalto de altura igual aos dos incisivos não limados.
Vivem os muxicongos um pouco mais desafogadamente que os mussorongos, devido a ser o solo daqueles um pouco mais fértil que o destes, e, como lhes fornece mais material para a construção e de melhor qualidade, as suas cubatas são melhor construídas, mais espaçosas, contendo em geral dois compartimentos.
… Como entre os mussorongos, não existe nos muxicongos uma forte organização social, de modo que, embora essa tribo habite uma extensa área do distrito e seja maior a densidade da sua população, não é de esperar que venham a causar quaisquer embaraços em problemas de ocupação ou de administração pela razão indicada, bem como pela sua índole..
Em São Salvador estão perfeitamente apáticos e recebem sem a menor relutância as ordens da autoridade... Apenas os povos de Quimbubuje, em fins de 1910, fizeram um simulacro de resistência ao pagamento do imposto de cubata e os povos da Canda andavam até então alheados à acção da autoridade, pela simples razão de lá não irem os seus delegados efectuar os arrolamentos e cobrança. A ocupação de Quimbubuje, em Julho de 1911, acabou por uma vez com quaisquer pruridos de rebelião, aceitando a Canda, actualmente sem grande repugnância , as imposições da nossa autoridade regular.
Os povos da Vamba, ao noroeste do Bembe, estão mesmo seperados politicamente dos muxicongos do sul da capitania-mor, e desde 1908 que reclamavam do nosso Governo a montagem de um posto em suas terras, pois que atribuem ainda hoje a morte de um dos seus sobas a envenenamento propositado, feito pelos muxicongos do sul, depois duma viagem que esse soba fez ao Ambrisete, em que eles suposeram que o soba tinha ido vender o “chão” ao Governo.”
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Extratos Extratos “ In- NO CONGO PORTUGUÊS VIAGEM DO BEMBE E DAMBA – Considerações relacionadas. Relatório do Governador do distrito, primeiro tenente de marinha, José Cardoso. Cabinda, 1913”
Pesquisa do Artur Méndes