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Portal da Damba e da História do Kongo

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Página de informação geral do Município da Damba e da história do Kongo


De Caçador a Guerrilheiro “O meu amigo Kasengo 1

Publicado por Nkemo Sabay activado 26 Abril 2010, 13:17pm

Etiquetas: #Usos e costumes da Damba

O Autor deste artigo, Mestre José Carlos de Oliveira ,viveu no Noroeste de Angola,foi testemunho da organização social das populações daquela região em que faz parte Damba,entre 1961 a 1975.Dividimos em duas partes.Esta é a primeira parte.


A distância da povoação do Quibocolo ao sopé da Serra da Kanda, núcleo geo‑histórico da UPA, andava pelos 15 quilómetros. Foi, provavelmente, da povoação Makanda que, internamente, saíram as ordens para o início das actividades da UPA, em Março de 1961. Lá casei e continuei a viver até que o ano de 1975 ditou o regresso. Em 1992 fiz uma breve visita a Angola, para rever velhos amigos e actualizar conhecimentos sobre diversos temas acerca dos Kikongo (aqueles que falam a língua kongo) do norte de Angola.

 
A vivência escolar (com meninos negros e mestiços, tanto pertencentes às elites urbanas como às tribais) e a posterior convivência de duas décadas com as populações da tribo Bazombo permitiram o aprofundamento do conhecimento do ambiente local, dos usos e costumes. A força das circunstâncias levou‑me a aprender a falar, ler e escrever a língua Kikongo, conhecimento que me valeu o ângulo de visão e de opinião “fonte” para mais tarde intensificar e sistematizar os “Estudos Africanos”na especialização de estudos Políticos e Sociais.
 
Fui incorporado, para prestação de serviço militar no ano 1959, em Nova Lisboa, sendo colocado em Maquela do Zombo (fronteira norte de Angola). Desmobilizado em Dezembro de 1960 e reincorporado novamente em Abril de 1961, prestei serviço nas zonas mais conflituosas, até Janeiro de 1963.
 
A Maria Cândida, minha mulher e companheira desde a primeira hora da guerra colonial, sempre me ajudou a reflectir e ponderar sobre os assuntos mais delicados que ambos vivemos. Com grande frequência, e sempre que elaboro textos com a finalidade de serem publicados, recorro ao seu invulgar senso de crítica. Passamos muitas horas a recordar Angola... Tem toda a paciência do mundo para me “ver” deambular pelas recordações do passado e, não raras vezes, relendo os textos corrige alguma imprecisão. Este caso não fugiu à regra.
 
Maquela do Zombo é a capital do Concelho do Zombo, do antigo distrito do Uíge. Está situada no extremo Norte de Angola, junto à fronteira com a República Democrática do Congo. A região tem uma altitude média superior a 900 metros, com grandes manchas florestais que, na direcção Damba‑Maquela do Zombo, apresentam, de quando em vez, frondosas matas. Através de densas neblinas matinais ficamos impressionados com esse mar encapelado de nuvens a perder‑se de vista. De repente abre‑se a cortina e pasmamos pelo aspecto sublime e grandioso da vegetação, comprimida em vales profundos, onde se encontram grandes árvores e, no seu cume, volta a ver‑se o denso nevoeiro. A água é frequente, abundante e de óptima qualidade, correndo tanto em leito de rocha como em areia limpa. O clima é altamente benigno. Não foi por acaso que lá se instalou, desde 1899, a Missão Baptista do Quibocolo. Perto também, o Governo Português criou a povoação comercial do Quibocolo. Fica a 1 100 metros de altitude, os seus terrenos são riquíssimos, as colheitas de milho, feijão, amendoim, leguminosas etc., são de especial qualidade. A língua falada é o Kikongo.
 
Entre os Bakongo, povo de origem Bantu (designação aplicada a um grande grupo etnolinguístico negro da África Meridional, constituído por cerca de 150 milhões de pessoas e que vivem ao sul do Saará, com excepção de pigmeus, bosquímanos e hotentotes). O termo bantu é demasiadamente conhecido como significando “homens”, generalização que se refere a povo, população, gente. O singular da palavra é Muntu, de onde se vai buscar o radical Ntu, que é universalmente aplicado pelos cerca de trezentos dialectos espalhados pela África Negra. O que se não refere por norma é que 1º Muntu deve ser traduzido por Pessoa Human; Ba, por sua vez, tal como foi mencionado, como “povo”, e Ntu finalmente, por cabeçao que sugere Bantu: povo da frente, e, seja‑me permitida a similitude: Bantu “povo escolhido”.
 
A Natureza entra toda em vibração. “O semelhante age sobre o seme lhante”, o ser humano pode reforçar directamente outro ser humano, porque a força vital, concedida ao homem, pode influenciar directamente no ser de forças inferiores. O dinamismo espiritual do povo Bakongo deverá ser analisado em função do seu universo mental. Nesses espaços, e não só, todos os assuntos que se prendem com o seu cosmos começam na sua própria casa... O seu conceito familiar matricêntrico, pauta‑se por normas diferentes das do Ocidente. Nestas populações de economia agrícola, as relações de parentesco têm como base os irmãos da mãe, esta e os seus filhos. Os filhos dum casal têm como “mãe grande” a irmã da mãe, se a mãe tiver uma irmã, por seu lado aquela que no Ocidente, é considerada a mãe, lá não é senão a “mãe pequena”.
 
Isto não diminui o amor da mãe biológica, embora, por vezes, superfi cialmente observadas pareça não dedicarem o mesmo afecto aos filhos que as mães brancas. Os sinais exteriores de meiguice e mesmo as lágrimas que estas vertem quando vêem os filhos maltratados, doentes, ou mortos parecem indicar um menor amor maternal. Não é assim. Em caso de perigo eminente, a mãe preta põe a salvo as suas crias. Se têm pouca comida reserva‑a só para eles e fá‑lo com alegria e satisfação. Lá no meio do mato qual é a preta que deixa, por dias ou por horas, os seus filhos, nos primeiros três anos, entregues ao cuidado de estranhos? Muito poucas são as ocasiões.
 
O pai grande é o tio, irmão da mãe. Tudo isto se considera por via uterina. O marido é sempre considerado o “pai pequeno”, nunca tendo os mesmos direitos que a mãe exerce sobre os filhos. De igual modo se processa o direito sucessório. Apesar do que muito vagamente se deixa dito, sugere‑se a maior cautela com as generalizações dos usos e costumes dos Bakongo. Existe sempre a necessidade de perscrutar todos os meandros da sua política familiar.
 
Os Bantu tomam a sua cultura como parte da religião. De uma forma geral, os Negro‑Africanos consideram a religião como elemento primordial da sua cultura. A experiência religiosa Bantu é um lenho demasiado bravo para que se deixe penetrar facilmente por enxertos, venham eles de onde vierem. O mesmo acontece com outras milenares religiões.
 
Para o Bantu e para a sua comunidade, viver é participar num drama religioso, e este ponto é fulcral, porque significa que vive no seio de um universo religioso. O padre Tchouanga explica que “Todos os actos da vida são expressões teoló gicas”. A característica essencial da religião dos Negros reside nas ligações da religião com a vida quoti diana. Daí que seja pertinente a introdução do Conceito de magia. Não é nada fácil a tarefa de encontrar um fio condutor que leve os leitores a entender este tipo de discurso e, assim sendo, sugiro a seguinte ideia de magia. Significa tanto criação como destruição. Criação duma primeira forma e principalmente a criação da forma suprema que encerra em si todas as outras, para posteriormente as libertar. A magia é exigida pela interacção vital. Brota como uma necessidade básica. É como que uma solução, conquanto resulte ambivalente visto que explica, propaga e remedeia o mal gerando também o medo.
                                                               José Carlos de Oliveira
                                                                Mestre em Ciências Sociaise e Políticas
                                                                Antropologia Cultural e Estudos Africanos.
                                                                
                                                         
                                                   
  


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