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Portal da Damba e da História do Kongo

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Página de informação geral do Município da Damba e da história do Kongo


Damba,1945-1953 (21)

Publicado por Muana Damba activado 15 Julio 2011, 20:44pm

Etiquetas: #Fragmentos históricos da Damba

 

 

 

 

Por Dr MANUEL ALFREDO DE MORAIS MARTINS. (Administrador da Damba 1945-1953).


Alfredo de Morais Martins.

 

O leão foi abatido pelos cipaios (2).

 

Regressado ao posto, tratou de lavrar minucioso auto de notícia em que descrevia, com prolixidade e num português não de todo correcto, a sua imaginada intervenção directa na morte do leão e que revestiu de pormenores em que ficava bem patente o perigo a que estivera sujeito e a coragem com que enfrentara a carga da fera, mal ferida com o primeiro tiro que o atingira. Composto o conveniente quadro e à laia de conclusão, alinhou, no final, uma série de propostas que, através do administrador da circunscrição, viriam à ser submetidas a apreciação e despacho do intendente do distrito. E nelas se alvitrava:

a) Que pele do leão fosse oferecida ao intendente do distrito;

b) Que se procedesse ao abate à carga do posto de largas dezenas de cartuchos de espingarda Kropatchek que teriam sido utilizados na caçada;

c) E que ao heróico chefe de posto fosse oferecida a espingarda com que abatera a perigosa fera.

Chegado o processo à sede do distrito, foi de pronto submetido a despacho do intendente. Este, que era, como atrás se disse, o Rui Leitão, já conhecia de tradição as artimanhas do chefe e já estava alertado para o que, na verdade, ocorrera na morte do leão. E logo pensou que a proposta de abate de tantos cartuchos, se destinaria a
cobrir o seu gasto indevido em anteriores caçadas de outro tipo. Por isso, de imediato despachou:

a) Apenas serão abatidos à carga do posto os cartuchos que, comprovadamente, tenham sido utilizados no abate do leão;

b) Quanto à oferta da espingarda ao proponente, nem pensar nisso;

c) E quanto à pele, que fique para o heróico chefe de posto, enquanto não se conseguir uma de urso que será a que melhor lhe quadra.

Como já por mais de uma vez referi, as casas dos administradores de circunscrição e, também, as dos chefes de posto, eram como que portos de abrigo para funcionários em trânsito e até para alguns particulares. E foi na Damba que mais funcionou essa como que instituição, dadas as condições do meio. É certo que havia uma modesta hospedaria que pomposamente ostentava o nome de hotel, mas só muito raramente os funcionários
que pela Damba passavam ali se alojavam. Apenas me lembro de uma excepção, aliás inteiramente justificada; foi a do inspector administrativo Baptista de Sousa quando na Damba esteve em serviço de inspecção. Não era curial que um inspector se hospedasse em casa do inspeccionado e se sentasse à sua mesa. Enquanto durou a inspecção à sede da circunscrição, apenas passava pela residência já depois de ter jantado na hospedaria, para conosco tomar café e passar o serão. Logo que iniciou a inspecção aos postos, passou a jantar na minha residência.

Estiveram na Damba e por mim foram hospedados algumas dezenas de altos funcionários dos serviços centrais de Luanda, mas chegam e até sobram os dedos de uma só mão para contar os que, de alguma forma, tiveram para mim e para minha mulher alguma atenção quando das nossas idas à capital. Apenas me recordo de termos
sido convidados para jantar nas residências de três altos funcionários: o Procurador da República Dr. Manuel de Mascarenhas Gaivão, o Dr. Manuel Ramos de Sousa, director dos Serviços de Economia e o Capitão Olegário Antunes, comandante geral da Polícia de Segurança Pública.

Visitas sempre recebidas com muito agrado eram as dos colegas dos concelhos vizinhos nas suas passagens pela Damba. Sabiam se as novidades que, de qualquer modo, afectavam o quadro a que pertencíamos, trocavam se experiências e até, por vezes, se entrava na má lingua. Mas se eu os recebia com prazer, eles também me pagavam na mesma moeda. Mas, neste aspecto, há que referir uma excepção. Quando passei a desempenhar as funções de administrador, ia todos os meses a Maquela do Zombo para fazer a entrega das receitas do Estado na Tesouraria de Fazenda Pública, uma vez que na Damba não existia tal serviço. Hospedava me no modesto hotel da vila mas era sempre obsequiado com convite para alguma refeição, quer pelo intendente do distrito,
quer pelo colega que se encontrava à frente do concelho.

Enquanto administrei a Damba, sucederam se em Maquela do Zombo uns quatro administradores e apenas um deles não teve para comigo a menor das atenções e esse procedimento aberrante em relação à prática corrente, deu origem a uma picardia minha.

A meio da manhã de determinado dia, apareceu me esse colega na Administração acompanhado dos seus dois filhitos. Fomos conversando e a certa altura um dos miúdos disse ao pai que estava com sede. Logo o outro lhe seguiu o exemplo e o próprio colega manifestou igual apetência. Como não tinha água na Administração, convidei os a dessedentarem se na minha residência. Ali chegados, disse ao criado para trazer copos e um jarro com água, mas logo ele, admirado com tal ordem, pois bem conhecia os hábitos da casa, me lembrou que havia cerveja e refrescos no frigorífico. Recordando as muitas idas a Maquela sem que desse colega recebesse qualquer atenção, de pronto retorqui: "Faz o que te mandei, porque o senhor administrador e os meninos só querem água fresca. Despediu se pouco depois e vim a saber que fora a almoçar à hospedaria."

 

 

 

                                               Com a colaboração de João Garcia e Artur Méndes.

 

 


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