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18 May

Contactos de Culturas no Congo Português.(23)

Publicado por Muana Damba  - Etiquetas:  #História do Reino do Kongo

 

                                                     CONTACTO DE CULTURAS

                                             NO CONGO PORTUGUES

  ACHEGAS PARA O SEU ESTUDO.


 

Por Dr MANUEL ALFREDO DE MORAIS MARTINS. (Administrador da Damba 1945-1953).


Alfredo de Morais Martins.

 

NAS INSTITUITUIÇÕES ECONÓMICAS

Agricultura 2

“ As plantas por nós levadas da Metrópole, aquelas a que nos referimos e outras que olvidámos ou desconhecemos já contribuíram para o enriquecimento do regime alimentar dos Congueses, mas nada valem em comparação com as de origem tropical que para o Congo transplantámos do Brasil ou de outras paragens.

Destas, as que mais cedo devem ter ido introduzidas são o arroz e o milho. Pigafetta informa: “ é o Mais, que é o mais vil de todos, que se dá aos porcos, e, assim também o arroz, é tido em pouco preço, e ao Mais designam por Maçã Mamputo, ou seja grão de Portugal, chamando eles Mamputo a Portugal (Mamputo,ou, melhor, nputu, é a abreviação da curruptela Mputugale (Portugal) ou mputulukezo (português))

O arroz foi introduzido em África pelos Árabes, antes das Descobertas, e levado da Ásia, mas parece-nos que no Congo a sua disseminação se deve aos Portugueses. Somos levados a esta conclusão por razões de natureza linguística. É que em todas as regiões onde se fala o quicongo é designado por lóosso ou lozo, evidentes corruptelas de arroz, dado que o r das palavras portuguesas se transforma sempre el l na sua adaptação à fonética quicongo, como noutro passo deste trabalho provaremos.

Se o arroz já existia antes da nossa chegada, teria um nome nitidamente banto. Devemos sublinhar o facto de que mesmo algumas plantas por nós introduzidas, ou os seus frutos, passaram a ser designados por vocábulos congueses, ou por se semelharem a outros já existentes, como no caso do milho e do feijão, ou por outras razões. Adiante falaremos no exemplo do amendoim. Mas não é apenas na zona em que se fala o quicongo que o arroz tem aquelas designações. O investigador francês Robert Reynard informa-nos que o vocábulo losso, a que atribui origem portuguesa, também designa o arroz no Oubangui e que lá foi levado, ou por natural difusão de tribo para tribo, ou pelos comerciantes de língua portuguesa. Parece não haver dúvidas de que o milho vulgar, o Zea Mays L, é originário da América do Sul e que foi introduzido em África pelos Portugueses.

“ Les Portugais le portèrent de trés bonne heure sur côte occidentale d’Afrique e jusque dans
les Indes” diz René Bouvier.

No tempo de Cavazzi já era muito cultivado: “ la cultura più comune e che rende maggiormente, è quella del massa-mamputu (semente portata dai Portoghesi) o mais che si raccglie due vole l’anno e matura in tre mesi”

O milho, que em grande parte de Angola passou a ser a base da alimentação dos indígenas, foi no Congo em breve desbancado pela mandioca e a sua cultura manteve-se até hoje mas sem carácter básico. È suprimento alimentar, consumido antes de atingir a completa maturação, assado nas brasas, e também utilizado, depois de seco, no fabrico de banvo, a cerveja indígena.

No Congo, de todas as plantas por nós para lá levadas, foi sem dúvida a mandioca aquela que que a cultura local com mais facilidade aceitou e mais rapidamente difundiu, por se adapta perfeitamente às condições ecológicas, pela simplicidade do cultivo, pela continuidade da produção, que evitava a construção de silos para conservação dos tubérculos, e por tantas outras razões, de entre as quis se deve avultar a circunstância de o seu sabor ter agradado ao paladar dos Congueses. É planta originária do Brasil e dali difundida para todo mundo. No México já existia quando da chegada dos Espanhóis.

No Congo a sua introdução deve ter sido feita no final do século XVI ou no princípio do século XVII. Pigafetta não lhe faz referência, mas no tempo de Cavazzi já a sua cultura se encontrava generalizada e os seus tubérculos reduzidos farinha, já eram alimento comum. Ele o diz no seguinte passo: “ Dall Barsile o, come altri voglione, dall’isola di S. Tomè, è stata qui introdotta la manioca, la cui radice ridotta quasi in farina serve di sostentamento a nobili e plebei. È un arbusto che, piantato e ramoscelli, germogli e meraviglia e produce presto copisissima. Il travaglio è ténue parché si pianta lavorando superficialmente il suelo. Pouca quantitá bolita in acqua si vede crescere più che il miglio europeu”

O entusiástico acolhimento feito pelos Congueses à mandioca e à sua rápida propagação, a ponto de a sua cultura passar a ser o centro de toda a actividade agrícola, são prova evidente da capacidade que o indígena possui para aceitação de inovações que lhe são francamente úteis, que facilmente se adaptam às condições locais de solo e clima e aos padrões da sua cultura.

Segundo a opinião corrente dos autores que se têm debruçado sobre este problema, a introdução da mandioca em África deve-se aos Portugueses e terá começado pelo Congo e por outras regiões do litoral angolano. Dali se foi difundindo para o interior, com maior ou menor intensidade e rapidez, segundo as condições locais. Parece estar averiguado que a difusão se fez de oeste para leste. No entanto, H. Baumann afirma que nós, Portugueses, a introduzimos também na costa oriental.

Hoje a mandioca é cultivada numa larga faixa de África, ao norte e ao sul do equador.

Já anunciámos resumidamente as causas que contribuíram para a rápida aceitação e difusão da mandioca. Passemos a analisar brevemente cada uma delas.

 

4.1245348838.mandioca-macaxeira-ou-aipim

                                       Mandioca descascada ( imagem simbólica )

 

A mandioca, oriunda da zona tropical do Brasil, veio encontrar no Congo condições climáticas idênticas e um solo adequado às suas exigências. Facilmente vingou e se multiplicou, despertando por certo curiosidade do indígena. Os introdutores, que no Brasil, tinham aprendido a cultiva-la e a prepará-la, passaram a incluí-la na alimentação do seu pessoal. O seu sabor deve ter agradado e a fama da nova planta começou a crescer. Hoje um, amanhã outro, os indígenas de S. Salvador passaram a incitar as suas mulheres a plantar alguns pés nas suas lavras. Como a multiplicação era fácil, pois se fazia por estacas que sempre pegavam, dentro em breve as mandioqueiras pululavam nas cercanias da cidade. A região oferecia condições óptimas e esta cultura, como aliás ainda hoje sucede, e depressa os tubérculos atingiam dimensões invulgares. Começaram a prepará-los como os Portugueses faziam e a introduzi-los na alimentação, em substituição dos cereais. Depressa notaram as suas vantagens em relação ao milho, ao luco, ao “massango” e à “massambala”. Enquanto aqueles colhidos por uma vez,
quando atingiam a maturação, e tinham de ser guardados para períodos que mediavam entre
duas colheitas, a mandioca conserva-se meses seguidos no solo, em condições de ser apanhada quando era necessário, em qualquer época do ano. Desaparecia o problema da armazenagem e afastava-se o fantasma da fome, que muitas vezes surgia, quer por imprevidência quer por deficiência de produção. Concluíram que a mandioca era a planta providencial que oferecia a solução do seu problema alimentar e atiraram-se à sua cultura intensiva. Com o decorrer dos tempos mais se foram capacitando das virtudes da mandioca. A sua cultura era facílima. A plantação fazia-se e faz-se na época das chuvas e o respectivo trabalho era simples e leve. Actualmente procede-se assim: limpo de capim e arbustos o terreno da savana ou desembraçado de paus e de lianas o da floresta, basta uma cavadela
superficial e amontoa de pequenos camalhões, onde duas ou três estacas, de 15 a 40 centímetros de comprimento, são espetados na vertical, horizontal ou obliquamente.


Aproveitando o amanho do terreno, a mulher indígena associa outras culturas à da mandioca, nomeadamente a do feijão, amendoim, milho, abóboras, batata-doce e outras cujo ciclo vegetativo é curto. Depois de colhidos estes produtos, os cuidados culturais da mandioca são escassos; basta uma capina de longe em longe. Passados alguns meses, de número variável conforme a variedade cultivada, os tubérculos estão feitos e prontos para serem preparados e consumidos. A produção pode ir de 5-6 até 50-60 toneladas por hectare, consoante a fertilidade do terreno. Em S. Salvador a produção por hectare é das mais elevadas.

É uma planta pouco exigente, mas, atendendo ao seu longo período vegetativo e ao volume da sua produção, rouba ao solo grandes quantidades de elementos nutritivos. Parece no entanto ser cultura menos esgotante que a dos cereais.

Devemos assinalar outra vantagem da mandioca em confronto com os cereais. Não necessita a guarda que estes exigem na época da maturação da espiga, para a semente tão ser devorada pela passarada que, em legiões de milhares, cai sobre as searas.

A mandioqueira é atacada por poucas doenças e só tem como inimigos os javalis, que são particularmente gulosos pelos seus tubérculos, e as pacaças e antílopes, que devoram a rama.

Os tubérculos, depois de macerados em água (onde se libertam dos princípios tóxicos que contêm), secos ao sol, triturados no pilão e peneirados, ficam reduzidos a farinha, que depois de cozida em água, constitui o “FUNGE”, base da alimentação da população do Congo. A mesma farinha, preparada com óleo de amendoim e condimentada com jindungo (capsicum frutecens), constitui a” TXIKUANGA” ou “ KIKUANGA”, também de grande consumo e que nos mercados indígenas se vende embrulhada em folhas de bananeira; é o farnel indispensável dos viandantes. Os tubérculos de algumas variedades podem ser também comidos depois de assados ou cozidos, sem necessidade de prévia maceração. A rama constitui verdura muito apreciada para a confecção de uma espécie de esparregado.

Não conhecemos os processos de cultivo da mandioca usados pelos Índios brasileiros na época em que foi introduzida no Congo, mas não nos repugna acreditar que fossem diferentes e que os Congueses os tenham alterado, adaptando-os à sua própria cultura, em suma, padronizando-os.

O nome mais vulgar desta planta, no Congo, é “ MADIÓKO”, corruptela do que introduzimos e que havíamos recolhido no Brasil, mas, além deste, tem outros de origem nitidamente conguesa.

Do centro de irradiação cultural que S. Salvador representava, a mandioqueira foi-se difundindo de povo em povo, de tribo em tribo, e depressa deve ter atingido as distantes regiões visitadas pelas caravanas de pumbeiros e de “bazombo”, que com elas mantinham relações comerciais.

Actualmente pode estudar-se directamente o processo da difusão da mandioca em algumas regiões de Angola onde era desconhecida até há pouco. Por louvável iniciativa do governador Hortênsio de Sousa, foram há poucos anos levados, em camioneta, milhares de estacas de mandioca pra longínquas terras do Cuando-Cubango, onde a sua cultura era desconhecida.


Os funcionários administrativos fizeram a sua reprodução e começaram a difundi-las pelas
lavras dos indígenas. Imediatamente estes aceitaram a inovação e passaram a dedicar-se com
entusiasmo à nova cultura, pois cedo se aperceberam das suas vantagens.

Continua

 

 

                                                                    Em colaboração com Artur Méndes

 


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