Contactos de Culturas no Congo Português.(15)
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Por Dr MANUEL ALFREDO DE MORAIS MARTINS. (Administrador da Damba 1945-1953).
ESTRATIFICAÇÃO SOCIAL
Quando chegámos ao Congo os seus habitantes já constituíam uma sociedade fortemente estratificada. Além de uma divisão entre homens livres e escravos, pode deduzir-se ainda, dos escritos que
temos mencionado, a existência de classes hierarquizadas entre a população livre.
A maior diferença de “status” social era a que existia entre o escravo e o homem livre, o “muntu abongo” ou “muntu a nzimbu”, isto é, o homem adquirido, e o “muntu a kanda” (homem que pertence a
uma Kanda) ou “mfumu”. Os filhos de escrava também tinham a designação de “muana a nzo”, filho da casa, ou “muana a bata”, filho da aldeia, indicando que eles não pertenciam a nenhuma Kanda e que
em qualquer idade ficariam sempre na aldeia de nascença, isto é, que a sua residência era patrilocal, em oposição aos filhos de mulheres livres que, depois de 8 ou 10 anos, iriam para junto dos
tios maternos, para o seio das suas verdadeiras Kandas.
Os escravos podiam ser adquiridos por compra, por captura na guerra ou em emboscadas, a titulo de indemnização por crime cometido ou ainda para garantia de dívidas.
Em geral, eram apenas vendidos os criminosos e os adúlteros incorrigíveis. Em é pocas de grandes fomes também as crianças e as mulheres eram vendidas. Os escravos eram em regra bem tratados e
faziam quase a mesma vida dos homens livres. Eram no entanto socialmente inferiores e não detinham a posse plena dos bens móveis que adquiriam, mas apenas o usufruto. Aquela pertencia ao dono.
Uma mulher escrava podia ser até preferida entre todas as mulheres, mesmo livres, que povoavam o “lumbu”.
Actualmente os descendentes dos escravos constituem uma parte muito importante da população, até a maioria nalgumas regiões. Um observador desprevenido não dará conta desta situação, pois, à
primeira vista, não existem diferenças apreciáveis entre os dois sectores, mas ao fim de algum tempo começará a notar pormenores que traduzem a inferioridade social daqueles. Constituem como que
a arraia-miúda em oposição a uma espécie de nobreza formada pelos “bantu a kanda”.
Entre os homens livres, a diferenciação social advinha sobretudo da senioridade. Em primeiro lugar em relação à Kanda a que pertenciam, pois entre elas há uma hierarquia. As mais antigas e as
mais extensas, as “Kanda dianene”, são superiores às “kanda fiote”, isto é, clã pequeno.
Dentro de cada Kanda, os diversos ramos também se escalonavam por ordem de senioridade, o mesmo acontecendo entre famílias extensas de cada ramo. O ancião do ramo mais velho tinha sempre a
primazia sobre os outros e o direito de senioridade estendia-se a todos os membros. Os elementos do ramo mais antigo de uma Kanda são sempre “yaya” ou “mbuta” (mais velhos) em relação aos ramos
mais novos, conhecidos por “beleke”. Os filhos de uma mãe “yaya” serão sempre yaya e terão precedência sobre os filhos de uma mãe nleke. Mesmo dentro de uma mesma família extensa, entre os
membros da classe de parentesco por “Kimpangi”, isto é, entre irmãos e primos sujeitos ao mesmo tio, os yaya, os mais velhos, explorarão sempre os nleke, ou mais novos.
Devemos considerar ainda uma certa diferenciação social baseada na profissão. No Congo, gozavam de predomínio os “nganga”, misto de curandeiros e feiticeiros, pelo poder mágico de que dispunham,
também os ferreiros.
Fora da organização das Kandas, existiam ainda outros grupos de indivíduos ligados por laços de camaradagem adquiridos por via de iniciações feitas em comum. Assim, os rapazes submetidos na mesma
época aos ritos da puberdade, ou seja à circuncisão e cerimónias complementares, conservavam e conservam pela vida fora laços de estreita solidariedade, passando a constituir como que uma
irmandade.
As seitas secretas, das quais a mais importante era a “Kipaxi”, a que adiante nos referiremos, também uniam os seus membros numa espécie de confraria em que até existia uma linguagem secreta,
privativa dos iniciados.
Continua…
Texto enviado por Artur Méndes