CONTACTO DE CULTURAS
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Por Dr MANUEL ALFREDO DE MORAIS MARTINS. (Administrador da Damba 1945-1953).
Na época do estabelecimento de ralações com o Reino do Congo os seus habitantes não se limitavam a usar, como vestuário, apenas peles surradas ou cascas de árvore batidas. Já sabiam tecer panos de fibras vegetais, bem urdidos e algumas vezes coloridos. Entre os presentes que o rei do Congo enviou a D. João II , por intermédio de Diogo Cão, ocupam lugar destacado esses tecidos. ( “Ho presente do dicto Rey de Congo pêra el Rey, era dentes dalifantes, e cousas de marfim lavradas, e muitos panos de palma bem tecidos, e com finas cores “) . Além das fibras de palmeiras, de que eram feitos os tecidos mais finos, empregavam também as extraídas da entrecasca do imbondeiro ( Adansonia digitata L.) e da “nsanda” ou “mulemba” ( ficus psilopoga Welw.ex Ficalho) .
Do imbomdeiro diz Cavazzi: “ L’aliconde non è per altro una pianta inutile: la corteggia si macera e si reduce in fila grosse e resistenti che, intrecciat, servono a farne cordami, reti,
tele per sacchi e panni ruvidi per i naturali”
O mesmo autor, logo a seguir, também se refere a tecidos de fibras de “nsanda” ou” mulemba”, feitos de maneira semelhante. Pigafetta, porém, ao referir-se à ilha de Luanda, diz existir nela
uma árvore a que chama “ençanda” e que pelo nome e descrição deve ser a “nsanda” do Congo, ou “mulemba”, em cuja “ primeira casca nasce uma certa quase tela que, batida e limpa, a estiram ao
comprido e largo; e dela vestem os homens e mulheres de ínfima condição”. Como Cavazzi viveu no Congo quase um século depois de Duarte Lopes, informador de Pigafetta, ter-se-á dado o caso de
nesse período se ter modificado a técnica do aproveitamento da casca da mulemba? Ou acultura dos Congueses seria mais evoluída, empregando a tecelagem, ao passo que as dos Ambundos, mais
rudimentar, a desconhecia? Dadas as ligações que existiam entre as duas regiões, visto que a ilha de Luanda era dependente do Rei do Congo e constituía, por assim dizer, a sua Casa Moeda, pois
era nela que se apanhavam as conchas denominadas “nzimbo” ou “”jimbo”, usadas como moeda, é natural que entre elas existisse grande diferença cultural. O mais provável é que coexistissem as
duas técnicas e que os panos tecidos constituíssem apanágio dos mais abastados, só usando as cascas batidas “os homens e mulheres de ínfima condição”.
Os panos de fibra de palmeira eram tecidos em quase todas as regiões do Congo, mas variavam no tamanho, na qualidade na perfeição do acabamento. Para essa diferenciação contribuía sobretudo
a qualidade das fibras.
Em todos os livros citados se encontram referências várias a estes tecidos.
A matéria prima era extraída da “Raphia textils Welw.”, a conhecida palmeira de bordão, cujo nome quicongo é “ditombe”. Ainda hoje existe na circunscrição do Cuango a industria de tecelagem
das chamadas “mabelas”, utilizando fibras de “Raphia” designada pelos indígenas pelo nome de “maimba”, que chega a ser cultivada. De resto, já no século XVI eram dedicados certos cuidados
culturais a essas palmeiras, como se deduz de um passo da Relação de Pigafetta:” Mas tecem panos devanditos de folha de palma, conservando as árvores rentes à terra, e todos os anos cortando-as e
podando-as com fundamento de, na nova estação, virem mais tenras”.
A fibra era extraída à mão “ da página inferior dos folíolos que se encontram dum outro lado ráquis das folhas como as barbas duma pena…”
A tecelagem fazia-se em teares verticais muito primitivos. A maneira de vestir variava com as classes sociais e grau de riqueza. Regra geral, tanto os homens como as mulheres usavam apenas
pequenas tangas, diferindo somente no material que eram feitas. O rei e os chefes traziam peles de animais sobre as tangas, à laia de aventais, e usavam também uma cobertura de mabela sobre os
ombros. Os trajos são pormenorizadamente descritos por todos os autores citados.
Em colaboração com João Garcia e Artur Méndes.