Adeus Padre Hortêncio Rossetto ( 1935 - 2012 ).

                             Padre Hortêncio Rossetto, na Damba. ( Imagem de José Xavier )

Como já foi escrito aqui, o padre Hortêncio viveu na Damba 45 anos! Meio século quase de  serviço mais nobre que pode existir na terra, o de missionário. Deixar as terras lindas de Venézia, na Itália, os seus familiares, amigos e instalar-se, ao longo deste tempo, em terras africanas perto do equador, com a finalidade de preparar o caminho para a vida eterna das suas populações, este tipo de sacrifício só é atribuido aos santos. Tal como o Saulo de Tarso, mais tarde conhecido por São Paulo, percorrendo toda a Europa, há dois mil anos, transformando os corações dos filhos"perdidos" de Deus, fundando congegações, assim o Padre Hortêncio o fez na Damba, caminhando distâncias longas, muitas vezes a pé, nas aldeias onde nunca se construiu nenhuma estrada, até já foi mordido por uma serpente, só para ilustrar em que condições trabalhava.

Em princípio do mês de Junho do ano passado, em convalescença, dias depois de sair no hospital da cidade do Uíge, onde estava internado, contactei-o para saber o seu estado de saúde. Claro que não podia me reconhecer, pensava eu, porque há 20 anos que não vejo mais Damba, 31 anos desde que deixei de viver na minha terra. Estava perdido na explicação para me identificar, em nome dos mindamba da diáspora, quando corta-me, em kikongo: Nge nani? e continou: E vata diaku kuna Ndamba kweyi dinanga? e eu respondi, sem grande convicção se  seria reconhecido , disse-lhe que era de Mbanza Mabubu, do Bairro Manga. E insistiu, tal como os nossos pais fazem, quando querem descobrir a tua origem e exigiu a resposta: E sediaku nani? Fui obrigado de explicar tudo. Fiquei impressionado quando reconheceu-me, para demonstrar que conhecia bem a minha família, teve a amabilidade de dar-me as novidades do meu irmão, que habita a cidade do Uíge!

                       A Missão Catolica da Damba ( Image de Ass. de Bakongo de Angola )

Tinha o prazer de escrever a contribuição do padre sobre a inserçao da juventuda de Damba na sociedade, um trabalho magnífico, em que eu sou testemunha. Mas o padre recusou a glória dos homens, minimizando a sua contribuição "eu nao sei o que eu fiz de especial na Damba!",  tentei recordar o padre o seus bons serviços na Damba, quando me interrompe: " é mentira, tudo que o sr escever ali sobre o meu trabalho na Damba será considerado como mentira. A mentira é um pecado! Recordando-me assim um dos dez mandamentos. Mas Padre, insisti eu, toda Damba conhece-te, eu vou simplesmente mensionar o que fizestes, desta vez com um tom paternista, reagiu: " Olha é bom o que estás fazer sobre Damba, mas não escreves mentira" . Uma exortação que notei e mudei de conversa.

  A Igreja São João de Brito, da Missão Católica da Damba ( imagem de Ass. dos Bakongos de Angola )

Em 1975, com o regresso dos mindamba refugiados da actual RDC, para além do heroísmo dos professores da Damba, como muitas vezes já foi refrenciado aqui, devemos considerar também, o da Igreja Católica, na sua Missão da Damba. Os padres Camilo Tarrasso, Rafael, Flaviano e Hortêncio Rossetto, na ausencia da administração digna deste nome na Damba, na véspera da independência do país, fizeram um tabalho titanesco, sobrehumano, para acolhimento dos regressados. Vimos muitas vezes a Missão ser invadida por homens, mulheres e crianças necessitadas a procura de auxilio. Aos domingos, a igreja abrias as 7 horas de manhã, para terminar as 14 horas ou mais tarde ainda, havia três missas ou quatro, a primeira para as crianças, oficiada muitas vezes pelo Padre Hortencio e repetia na missa a seguir. Depois seguia a missa de francês com o padre Flaviano e para terminar, a missa em kikongo com os velhos, pelo padre Camilo. Talvez, por ser jovem na altura, em relação com os outros padres, o Padre Hortêncio era o omnipresente em toda missão, sobretudo com os jovens. Se não está na biblioteca, encontará o padre na imprimaria, na oficina mecánica com o Sr Varela, ou a trabalhar com o "coupe-coupe" para tirar o capim no jardim da missão.

                     A entrada para a Missão Católica Damba ( Foto de Ass. dos Bakongo de Angola)

E o pomar da Missão? o anjo guardião era ele. Por motivo da consciência era quase impossível entrar ali, para muitos cristãos não se podia roubar as frutas dos padres. Quando as nésperas e outras frutas estavam maduras, a tentação era tão forte, que os mais corajosos ou pecadores, chegavam penetrar e roubar as frutas! Mas eram obrigados, mais tarde, a confessar os seus pecados ao padre, que lògicamente, perdoava-os.

Foi o padre Hortêncio que teve a iniciativa de fundar o Fc Academica da Damba, com os equipamentos desportivo em cores preto e branco. Esta equipa, como se sabe, fusionou mais tarde com o Fc Damba, do Prof. João Kubaya, para formar  o Fc Nzazi do Nzibudi, Ngunza e Rita. O equipamento do Fc Académica oferecido pelo padre Hortêncio (parecido com do Juventus de Torino, na Itália), será utilizado pelo Fc Nzazi. Será também o Padre Hortêncio que vai dar o terreno da missão à Juventude da Damba para os jogos de futebol, seria um terreno com relvado, não acabou completamente quando foi nacionalizado. Quem viveu na Damba, sabe muito bem que o terreno de futebol da Missão, a metade, está relvado.

Antes de deixar este trabalho com a juventude, para o padre Marino, em 1979, foi padre Hortêncio que recrutava os ajudantes, que seja da missa como fora, muitos jovens passaram  suas vidas na missão, outros viviam lá, repartidos em diversas terefas, como, jardinheiros, cozinheiros, imprimeiros, os que trabalham na secretaria, etc. Citamos, Mbozo, Lucas (Luc), Mpaka Mbenza, Alberto Mbenza, Camilo irmão do Massiya, Zinga Kindoki "Jungle", Dokota e o seu irmão Dickens, Malungo que veio de Lemboa (hoje está nas forças armadas), Ndala, Domingos Lutungi, a memória já falha, deixo aos outros completar a lista.

Como o Padre Camilo Tarrasso, o padre Hortêncio foi um mundamba   verdadeiro, o seu nome será gravado em letras de ouro nos corações dos mindamba.

                                                                                                    Muana Damba