Por Dr. Joâo Morais Martins
Faria ontem 98 anos. Deixou-nos no dia 21 do passado mês de Maio. Duas grandes paixões, Angola e a investigação dos usos e costumes das populações.
A primeira começou em 1945 como Chefe de Posto estagiário e terminou em 1967 como Secretário-Geral da Província, o lugar imediatamente a seguir ao de Governador-Geral, de que era substituto nas ausências.
Iniciou-se em 1945 na Damba, terra do norte de Angola, onde também serviu como Secretário e Administrador do Concelho, e contribuiu para o desenvolvimento, introduzindo água canalizada, iluminação pública, campo de aviação com aerogare e torre de controlo, oficinas da administração que na altura granjearam grande fama aos artesãos e artífices, principalmente na manufactura de mobílias. Também possibilitou fundação do povoado de Mucaba, que teve um desenvolvimento acelerado e se tornou sede de concelho. Ao combinar com os sobas políticas de trabalho justas, que ele explica nas suas memórias, motivou o regresso em massa das populações que estavam refugiadas no então Congo Belga, para fugir do trabalho obrigatório compulsivo que alguns colegas seguiam contornando a lei. Estas políticas motivaram a queixa das grandes companhias junto do governo, que levaram a ser transferido em 1953.
Rumou para o outro extremo da então colónia, para ocupar o lugar de Intendente do Distrito de Moçâmedes, até 1955, quando uma grave doença da mulher o fez regressar a Lisboa. De 1956 a 1958 frequentou o então Instituto Superior de Estudos Ultramarinos em Lisboa e em meados desse ano retornou a Angola onde foi ocupar o lugar de Administrador do Concelho de Malanje e posteriormente o de Intendente até Julho de 1960, por ter sido colocado como Inspector no Ministério do Ultramar, no Gabinete de Negócios Políticos.
Nesse lugar teve missões de trabalho em Angola, de Fevereiro a Abril de 1961, em Maio-Junho de 1961 como membro da delegação portuguesa na Reunião do Concelho de Segurança da ONU e em Setembro do mesmo ano como consultor na representação de Portugal na NATO em Paris.
Em setembro de 1962 foi ocupar o lugar de Secretário-Geral de Angola onde acompanhou o Governador Silvino Silvério Marques e posteriormente, durante seis meses, o governador Camilo Robocho Vaz. Em Abril de 1967 foi colocado como Inspector Superior da Administração Ultramarina e cumpriu missões de serviço em Timor (1968), Angola (1972) e Cabo Verde (1973). Em fevereiro de 1974 passou à situação de aposentado por dissidências com o ministro de então.
A outra paixão a investigação. Até 1974 o seu interesse canalizou-se para as populações de Angola, principalmente as no norte e, a partir de 1975, para as de Castelo Branco e arredores o que propiciou a escrita de várias publicações, de que se podem destacar:
“Contacto de culturas no Congo Português – Achegas para o seu estudo” (1958), prémio ”Frei João dos Santos”.
“Os deveres do funcionário ultramarino que advêm da sua condição de cristão” (1958)
“A influência do português no Quicongo” (1958)
“Subsídios para o estudo da luta anti-alcoólica em África” (1958)
“As migrações de indígenas no ultramar português” (1958)
“O mel na medicina popular”(1984)
“Malpica do Tejo. Terra pobre, povo nobre” (1986)
“A história de um sobado de Malanje. Um caso de cooperação luso-angolana no século XIX” (1995)
“Angola – Do meu bornal de recordações” (1998)
“A ascensão da burguesia em Castelo Branco no século XIX” (1991)
“Castelo Branco. Um século na vida da cidade, 1830-1930”, Volume I (2004)
“Castelo Branco. Um século na vida da cidade, 1830-1930”, Volume II (2010)
Ligada à investigação esteve também a sua acção como docente universitário. Doutorado em Ciências Sociais, ramo Antropologia Cultural no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade Técnica de Lisboa (1986), lecionou nesse mesmo Instituto, no Instituto Superior Politécnico Internacional e na Universidade Internacional.
Colaborou também activamente com a Sociedade de Geografia de Lisboa
1941 Outubro - Antes de embarcar para os Açores, onde esteve mobilizado, na chamada "guerra dos ananazes"
1972 Durante a visita de inspecção a Angola no Moxico com os funcionários administrativos aí colocados
1949 Na jangada do rio Koge, perto da Damba, com Padre Hilarino,o Dr. Marcel Blanc, delegado de Saúde, e o chefe de posto estagiário, Mário Ferreira Gonçalves.
1949 Na ponte pensil do rio Kuilo , perto da Damba, com João Marques Proença, chefe do posto de 31 de Janeiro (Nsosso), Padre Hilarino de Cassaco, da missão da Damba – à Damba, Uíge.
1965 Visita a uma regedoria no Uíge, com o governador geral Silvino Silvério Marques e o governador do distrito Camilo Rebocho Vaz, curiosamente os dois governadores gerais com quem colaborou.
1961 Maio, na reunião do Conselho de Segurança da ONU, onde se discutiam os acontecimentos em Angola, como membro da delegação portuguesa. De notar que a nossa delegação está colocada entre a da URSS e as dos Congos. Embaixador Vasco Garim e Dr. James Pinto Bull, natural da Guiné, e colega do meu pai no ministério
1961 em Abril na Baixa de Kassange com o governador de Malanje Bandeira de Lima, na viagem de inspecção a Angola para estudar os acontecimentos desse ano, por causa da monocultura obrigatória de algodão
2007.11.01 Homenagem em Malpica do Tejo pela sua contribuição para a divulgação de aspectos culturais da sua população, com a atribuição do nome de uma rua – à Malpica do Tejo.