Overblog
Edit post Seguir este blog Administration + Create my blog
24 Jan

Idosos amparados no lar de Quituma

Publicado por Muana Damba  - Etiquetas:  #Notícias do Uíge

Fotografia: Mavitidi Mulaza | Uíge
Fotografia: Mavitidi Mulaza | Uíge

Por Joaquim Junior

O Centro de Acolhimento do Quituma, na cidade do Uíge, abriga idosos abandonados pela família pelos mais variados motivos. Alguns perderam o contacto com os filhos durante a guerra, mas há aqueles que foram rejeitados depois de serem acusados de feitiçaria.

A manhã foi de trabalho para os idosos do Centro de Acolhimento do Quituma. À sombra do alpendre que protege a cisterna de água, Alberto Capapelo, 86 anos, segurava uma mandioca na mão esquerda e com a direita usava a faca para descascar o tubérculo.


Apesar dos gestos lentos e das mãos trémulas, dava a sua contribuição no descasque das mais de duas toneladas de mandioca colhidas no dia anterior, numa lavra criada pela Direcção Provincial da Assistência e Reinserção Social.


A mandioca produzida numa área de cerca de dois hectares, localizada no município do Bembe, é transformada em fuba de bombó e usada para confeccionar as refeições dos idosos.


Alberto Capapelo é um dos 61 idosos acolhidos no Centro do Quituma, onde vivem em ambiente familiar, sob o olhar atento dos assistentes sociais. A responsável do centro, Maqueto Madalena Bunga, disse à reportagem do Jornal de Angola que, graças aos esforços da Direcção Provincial da Assistência e Reinserção Social e ao apoio da sociedade civil, os idosos ganham auto-estima e alegria de viver.

Necessidade de apoios

A cada amanhecer, os velhos tratam da higiene pessoal, a que se segue a distribuição do pequeno-almoço pela equipa de cozinheiros às 16 residências que compõem o centro. Aos idosos em boa forma física são distribuídos pequenos trabalhos de terapia ocupacional, como varrer ou cuidar do jardim.


No salão de terapia ocupacional, criado no ano passado, os idosos efectuam trabalhos de artesanato, como o fabrico de vassouras com picos de palmeira e bancos de bordão, além de contarem histórias. É também no salão que os responsáveis do centro juntam os mais velhos para trocarem ideias e passarem orientações precisas para o bom funcionamento da casa.
Maqueto Bunga disse que são necessários mais apoios para manter o centro. São necessários alimentos, produtos de higiene e vestuário para os idosos. “No momento difícil que o país está a atravessar, tem sido um grande exercício conseguirmos gerir o centro”, afirmou.


Maqueto Bunga reconheceu a forma como a sociedade tem respondido aos pedidos de apoio. Todos os meses, o centro recebe visitas de instituições e grupos de pessoas “que se lembram dos velhos que vivem no lar”. Com esses apoios, a Direcção Provincial da Assistência e Reinserção Social tem sempre algo para manter o lar a funcionar.

Voltas que a vida dá

Alberto Capapelo nasceu em Outubro de 1929 na cidade do Cuíto. Perdeu a mãe com um ano de idade e pouco sabe acerca do pai, José Capapelo. Foi criado por uma cidadã portuguesa, de nome Alice Barata.


Aos 20 anos, como homem já criado, deixou a família que o adoptou e foi trabalhar como aprendiz numa oficina de mecânica. Os mestres ensinaram-lhe os segredos dos motores, sobretudo de máquinas pesadas. Poucos anos depois, conheceu Lúcia Lussinga, com quem casou e teve oito filhos, dos quais apenas quatro sobreviveram, Esperança, Santos, Mário e David.
Por motivos sociais, a família mudou-se do Bié para a vizinha província do Huambo, onde viveu durante muito tempo até que a mulher foi atacada por uma doença rara que os obrigou a emigrar para o Uíge, onde Lúcia Calussinga acabou por morrer, deixando-o com quatro filhos.

Saudades dos filhos

Velho Capapelo, como é carinhosamente chamado no lar, contou que, na altura, as condições de vida eram difíceis e não tinha como sustentar os quatro filhos, o que os levou a ir para Luanda.


Sem saber do paradeiro dos filhos, encontrou abrigo no Centro da Quituma, em 2010. Aqui, disse, foi “recebido com as duas mãos”. Nesta nova família, sente como se tivesse renascido. “Tenho sempre a roupa limpa, a cama arrumada, alimentação a tempo e horas. A única coisa de que sinto falta é dos meus filhos, que não vejo há anos”, afirmou.


O idoso aproveitou a ocasião para deixar uma mensagem a quem ler a reportagem do Jornal de Angola e conhecer o paradeiro dos filhos, que faça o favor de lhes comunicar que está vivo e com muitas saudades deles.
No lar, Velho Capapelo trata do jardim, paixão que herdou da família que o adoptou na infância. “Quando era criança, gostava de brincar com as flores no jardim e na adolescência passei a cuidar das plantas da casa. Aqui no lar, procuro transmitir esta paixão aos colegas”, referiu.

Fabricante de fogareiros

José João, mais conhecido por “Cabo-verdiano”, foi levado de Malanje, sua terra natal, para o Uíge, por um colono português como contratado e colocado numa fazenda dos arredores da cidade. Alcançada a Independência Nacional, ainda jovem permaneceu nas terras do bago vermelho e casou-se com Madalena António, com quem gerou dois filhos.
Com a juventude consumida pela colonização, Velho Cabo-verdiano não teve tempo para estudar nem aprender uma profissão. Encontrou no fabrico de fogareiros a única opção para sobreviver. Com o aproximar da velhice e sem cuidados de saúde, foram-lhe faltando forças para levantar o martelo e pegar na catana, instrumentos usados para cortar as chapas de metal.
A situação piorou e o então residente no bairro Gaio esteve à beira da indigência. Informada a Direcção Provincial da Assistência e Reinserção Social, foi alojado no Lar do Quituma. Com o apoio e cuidados que recebe no centro, Velho Cabo-verdiano, agora com 75 anos, sente-se restabelecido fisicamente e ocupa os tempos livres com o fabrico artesanal de fogareiros, candeeiros de lata e outros objectos, que manda vender no mercado.

Acusada de feiticeira

Maria Pedro, 80 anos, natural de Bau, município do Songo, está no centro há dois meses. Em Setembro passado, foi espancada por um dos seis filhos, que a acusou de feitiçaria e a expulsou de casa.


A idosa disse que tudo começou em meados do ano, quando uma das suas filhas perdeu uma criança, sua xará, vítima de doença. Durante o óbito, alguns membros da família, atiçados pelo filho, apontaram-na como culpada da morte da menina.


Avó Maria lamenta a forma como ela, que sempre foi a protectora da família, acabou por ser rejeitada pelos filhos, netos e bisnetos, sob acusação de feitiçaria. Obrigada a pedir socorro à Administração Municipal do Songo, foi recolhida pelos serviços de Assistência e Reinserção Social e encaminhada para o lar do Quituma.


“Não sei como funciona esse segredo do mal. Se soubesse, talvez os meus próprios filhos já não existissem. Fui sempre uma mãe protectora, perdi o marido muito cedo, mas nunca abandonei os meus filhos. Infelizmente, hoje chamam-me feiticeira, coisa que eu nunca esperei”, afirmou.


Maria Pedro disse que, agora no lar, sente-se como alguém com lugar na sociedade e procura a todo custo recuperar das feridas emocionais causadas pelas acusações, agressões e o desprezo familiar. O que mais deseja é que os parentes vivam em união e afastem o espectro da feitiçaria.


O Centro de Acolhimento de Idosos do Quituma fica a cinco quilómetros da cidade do Uíge. Alberga 49 homens e 12 mulheres. Possui um posto médico para tratar das doenças correntes, um tanque de 40 mil litros e um pavilhão de terapia ocupacional. A electricidade provém de um gerador e, para garantir a segurança dos anciãos e funcionários, tem instalado um posto de vigilância policial.

Via JA

Archivos

Acerca del blog

Página de informação geral do Município da Damba e da história do Kongo