Savimbi e Holden andavam em bulhas.
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Por Loló Neto Kyambata (*)
O longo Caminho percorrido.
Daquilo que eu sei, tudo começou no já longínquo ano 1960, quando Savimbi teve uma efémera passagem por Lisboa, onde conheceu resistentes antifascistas, tendo sido preso pela PIDE e liberto pouco tempo depois. Não se sabe, ao certo, se naquele tempo o pequeno Jonas estaria já filiado àquela organização fascista, nem o percurso que utilizou na sua trajectória rumo à Suíça acolhedora.
Em 1961, obteve uma licenciatura em Ciências Políticas, onde foi bolseiro da United of Christ em Fribourg.
Segundo Lúcio Lara, em 1961, Savimbi escreveu, em primeira instância, para o MPLA, com quem trocou uma série de correspondência, cujas cartas o mais velho Lara disse: “Ainda as
conservo e estão bem guardadas”.
Foi o Viriato da Cruz que respondeu a Jonas Savimbi, felicitando-o dizendo que poderia vir
quando quisesse. E foi mantendo uma correspondência regular com o MPLA. Em contra-partida, a partir da Suíça, afirmou que estava a ser contactado, igualmente, por missionários
ligados a Holden Roberto, que queriam que ele fosse para a UPA, porque, - segundo ele, “seria mais útil na UPA, para mais facilmente fazer a unidade com o MPLA”.
Viriato da Cruz recusou-se a aceitar essa história!!! Passado um tempozinho, os missionários disseram-lhe que Savimbi tinha aceitado trabalhar com a UPA.
Viriato Francisco Clemente da Cruz nasceu a 25 de Março de 1928 em Kivuvu, Porto Amboim,
na província do Cuanza Sul. Fez os seus estudos secundários no Liceu de Luanda. Trabalhou no Ministério da Educação, donde foi expulso em 1952. Foi o fundador da Revista Mensagem e empregado de livreiro. Sentindo-se perseguido pela PIDE, abandona Angola, a bordo do paquete Uíge e vai para Lisboa e Paris onde se encontrou com Lúcio Lara, Mário Pinto de Andrade, Dr. Eduardo dos Santos, o ‘Muanha, o médico’ e Amílcar Cabral, onde lhes expôs a situação política vigente então em Angola. Exortou-lhes para se organizarem em moldes africanos e para se tornarem autónomos dos partidos de oposição portuguesa, de acordo com Edmundo Rocha.
Na UPA, Savimbi tornou-se secretário-geral do GRAE (Governo Revolucionário de Angola no Exílio) e nomeado chefe das Relações Exteriores. Faziam parte do dito Governo, Holden Roberto como primeiro-ministro, assim como:
- Manuel Kounzika, vice-presidente (PDA);
- Cónego Manuel das Neves, segundo vice-primeiro-ministro (UPA);
- Jonas Savimbi, ministro dos Negócios Estrangeiros (UPA);
- Rosário André da Conceição Neto, ministro da Informação (UPA);
- Fernando Pio do Amaral Gourgel, ministro da Guerra (UPA), que, mais tarde, em presença de Holden Roberto, assistiu impávido e sereno ao fuzilamento do próprio filho, o meu amigo Elias Pio do Amaral Gourgel, irmão do Abraão Gourgel e do falecido cantor Beto Gourgel ‘Ganjeta’;
- Dr. José João Liauca, ministro do Interior (UPA);
- Manuel Ziki, ministro das Finanças (PDA);
- Eduardo Pinnock, ministro do Armamento (UPA);
- Fernando N’Dombele, ministro dos Assuntos Sociais (PDA);
- Ministro da Educação, na altura vago (PDA);
- Johnny Eduardo Pinnock, secretário dos Assuntos Estrangeiros (UPA);
- Maurice N’Dombele, secretário de Estado das Finanças (UPA);
- Víctor Afonso, secretário de Estado da Educação (UPA);
- Aníbal da Silva Melo, director político (UPA);
- José Manuel Peterson, mais tarde também conhecido por Kiasonga Manuel Peterson-
director da Segurança ( UPA).
Com a formação da OUA (Organização da Unidade Africana), a 25 de Maio de 1963, a UPA tinha intensificado as suas acções militares, tendo sido reconhecida por esta organização.
Houve um período de instabilidade no então Congo Belga (Kinshasa, Zaire, RDC actual). A morte de Patrice Lumumba, a expulsão do Congo-Léo para Brazzaville, em que mais tarde, o
MPLA teve de se mudar a todo custo, para Cabinda, em consequência da primeira dissi-
dência de alguns dos seus membros ligados à pequena burguesia que se afastaram da direcção do movimento, o que provocou que se instalasse a confusão geral, e muitos até foram entregar-se às autoridades portugueses e à PIDE.
Savimbi e Holden andavam em Búlhas
A confusão não estava só no seio do MPLA, também ela tinha atingido a UPA, não obstante terem sido verificadas algumas acções que se fizeram sentir no terreno das operações, principalmente devido à interdição decretada pelo regime do presidente Joseph Kasavubu e do primeiro-ministro Cyrille Adoula, a mando de Holden Roberto, que proibia o desenvolvimento da luta armada que se efectuava na primeira região do MPLA.
Savimbi, por seu lado, ia constatando e afirmando: “Aqui há muito tribalismo. Eu estou muito atrapalhado. Eu e alguns umbundos queremos safar-nos, queremos fugir daqui. O MPLA que ponha à nossa disposição as canoas”. Dada a urgência e exigências manifestadas, e tendo em conta as contradições seculares então vividas entre o MPLA e a UPA, foi dado o feu vert que autorizava a travessia difícil do rio Zaire, denominada de ‘Vitória ou Morte’.
É também nesta altura que Holden Roberto foi acusado não só de tribalismo, como de per-
seguição às outras tribos.
O caldo entornou entre Savimbi e Holden. Assim é que o Chefe do dito Governo Angola-
no no Exílio declarou, a 20 de Julho de 1964, que o Governo e o Conselho Nacional Angola-
no demitiram o “Senhor Jonas Savimbi do cargo de Ministro dos Negócios Estrangeiros,
segundo decisão tomada em Léopoldville no princípio do mês corrente”.
Holden Roberto disse que “esta decisão fora tomada devido às suas infelizes atitudes para com os seus colegas do Governo e as mentiras que ele espalhava entre os nacionalistas. Holden Roberto desmentiu que Savimbi fosse membro da delegação angolana à Conferência de Chefes dos Governos Africanos que se reuniu e classificou de ‘grossa mentira’ a afirmação
de que a resistência à ‘ocupação’ portuguesa de Angola tivesse praticamente fracassado.
Holden Roberto disse, igualmente, que, quando fora tomada a decisão de demitir Savimbi, ele não se encontrava em Léopoldville. “Desejamos informá-lo da sua demissão, mas ele
desapareceu e reapareceu no Cairo, apresentando-se à Conferência, dizendo que a sua
demissão era ilegal, em vez de o fazer ao seu Governo”. Holden Roberto continuou, afirman-
do que “a prova de que ele não era membro da delegação é que não estava instalado no Hotel
Hilton, onde se encontravam hospedados todos os chefes das delegações e os seus adjuntos.
Jonas voltou à carga e, fazendo novas declarações, declarou que “a decisão dos movimen-
tos de libertação impedia a mobilização das massas de Angola, considerou que o Governo
de Holden Roberto, em vez de aumentar a acção militar e reagrupar as massas populares, se limitava a fazer declarações sem futuro”. Denunciou as ligações que Holden e a UPA mantinham com a CIA (Central Intelligence Agency) e indicou até os nomes dos homens da agência americana que trabalhavam em Kinkuzo, que era uma base de triste memória, situada numa fronteira não muito distante de Angola.
Savimbi é, também, acusado de “criar a intriga no seio da UPA” e foi dito que ele arranjou a discórdia entre Holden e o PDA (antigo). Houve mesmo uma ‘sarrabulhada’ entre os dois,
que se envolveram em desordem.
Outras fontes afirmaram que, dada uma incompatibilidade verificada entre ambos, Savimbi se preparava para criar um movimento que foi apelidado de ‘Amigos do Manifesto de Angola’, que tinha como objectivo “arrastar alguns membros dissidentes da UPA”. Ele planeou servir-se de ‘Militares do Sul’ para realizar uma ofensiva contra Cabinda, e dizia-se, que tinha, em vista, libertar uma zona onde pudesse instalar um “Governo Angolano e que ele seria o Presidente”.
Dos arquivos da PIDE, consta que Savimbi e o Dr. Liauca fizeram um complot para assassi-
nar Holden Roberto. É dito que eles teriam tentado subornar o comandante de Kinkuzu com
a soma de 14 mil francos para procederem à operação, mas que o comandante foi a Léo-
poldville e entregou a importância a Holden Roberto, denunciando a intenção (documen-
to da PIDE n.o 96 - n.o 039C64).
A última fuga de Savimbi
Não conseguindo o seu objectivo, Savimbi, uma vez mais, desapareceu e surgiu em Dar-Es-Salaam (Tanzânia), o que terá sido a última viagem antes de criar a UNITA.
Não tendo conseguido o lugar de chefe das Relações Exteriores, Jonas desligou-se definitivamente do MPLA e de lá, beneficiando das independências, tanto do território de Tanganica, em 1961, com Julius Nyerere como primeiro-ministro e mais tarde, em 1963, já como presidente, que com a junção com a Ilha de Zanzibar, tornou-se em República da Tanzânia.
Em 1964, a Rodésia do Norte obteve a sua independência, tornando-se Zâmbia, com o Dr.
Kenneth Kaunda, como presidente.
Neste espaço de tempo, Savimbi viveu na actual Tanzânia. Aliás, o nome UNITA surgiu em Dar-Es-Salaam. Só depois, em 1966, é que o ‘Galo Negro’, com o espírito de Mwangai, fez
um combate, dando início às hostilidades em Teixeira de Sousa, actual Luau.
Com as repercussões do ataque da UNITA, no caminho de ferro que sai do Lobito até ao Luau, Kenneth ordenou a retirada imediata de Savimbi. Foi por esse motivo que ele foi, novamente, para o Cairo. Daí, entabulou relações de amizade no quadro da OSPAAL (Orga-
nização de Amizade com os Povos de África, Ásia e América Latina), uma organização cria-
da em 1966 durante a Conferência ocorrida em Havana e que contou com a participação
de 82 delegados.
Na OSPAAL, conheceu no Cairo o jovem Rupiah Banda, que se tornou ministro dos Negócios Estrangeiros e, mais tarde ainda, assumiu o cargo de Presidente da República da Zâmbia.
Foi Rupiah Banda que fez os corredores e que convenceu o presidente Kaunda a aceitar a UNITA , tanto mais que, no partido UNIP, havia alguns indivíduos que, por razões tribais e regionais, tinham igualmente simpatias com os homens do ‘Galo Negro’. Citam-se os nomes de
Enock Kavindele e de Vernon Mwanga, entre outros.
Entre 1964 e 1966, Savimbi fez naveta entre Dar-Es-Salaam e Cairo, e de lá, clandestina-
mente, esteve escondido, e a coberto de uma ala da SWAPO, que lhe fornecia algumas armas.
A PIDE entra em acção
Segundo Jean-Pierre Mbala, Holden Roberto acusou nos seguintes termos: “Nós não temos mais confiança nele; nós não sabemos por conta de quem ele trabalha e quem é que lhe paga”. Jean-Pierre Mbala fez parte do grupo de cinco dirigentes do MDIA que se deslocou a Luanda, no tempo colonial, e mantiveram conversações com a PIDE, e que chegaram ao conhecimento do presidente do Conselho de Portugal, o Dr. Oliveira Salazar. São indivíduos que colaboraramcom a PIDE.
O MDIA (Movimento de Defesa dos Interesses de Angola), na sua Reunião Constitutiva, era formado pelos seguintes elementos dissidentes da UPA e que tinham ligações estreitas com o ABAKO do antigo presidente Joseph Kasavubu e que, por sua vez, ainda tinha familiares em Angola. O MDIA pediu autorização à PIDE, para instalar os seus escritórios em Angola. Este pedido trouxe-os a Luanda a 26 de Agosto de 1962. Os dirigentes do MDIA foram:
- Alberto Matundu, presidente;
- François N’Dombele, vice-presidente;
- Jean-Pierre Mbala, secretário-geral;
- Francisco Mayembe; secretário-geral-adjunto;
- Manuel Guimarães, tesoureiro;
- Martin Nsenuber, comissário de contas;
Estes indivíduos em Luanda para ganhar protagonismo mantiveram contacto com o CITA (Centro de Informação e Turismo de Angola), uma organização criada por ‘bufos da PIDE’, e que se perderam pelo seu oportunismo!!!
(*) Nacionalista angolano
Fonte: Jornal Agora