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Portal da Damba e da História do Kongo

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Página de informação geral do Município da Damba e da história do Kongo


Da morte de Dom João a entronização de Dom Afonso I.

Publicado por Muana Damba activado 14 Octubre 2013, 09:41am

Etiquetas: #História do Reino do Kongo

 

Por Patrício Cipriano Mampuya Batsikama


 

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O reinado de Nzîng’a Nkûwu, tal como fora encontrado pelos europeus, não ofereceu suficiente compreensão do sistema administrativo Kôngo, nem favoreceu a compreensão da operacionalidade
do poder político. Por isto, inevitavelmente os portugueses utilizarão referências comparativas do próprio modelo monárquico para compreender este novo mundo kôngo. Rui Pina, Garcia de Resendes e mais tarde Pigafetta deram-se conta disto nos seus escritos, com António Cavazzi a diferir-se um pouco por suas obervações e descrições antropológicas e etnográficas mais elaboradas.


180px-Jean_Roy_de_Congo-copie-1.jpg                                                      Ntinu Ndozuawu Zinga a Nkuvu

 

 

Nesse contexto de crescente civilização cristã do Kôngo produzir-se-ão factos políticos dignos de nota. Porque o emissário Luís de Sousa, que acompanhou Diogo Cão à Mbânza-Kôngo, se fizera acompanhar
de alguns soldados portugueses, passariam a circular boatos de que a intenção era entronizar Dom Afonso I (Mvêmb’a Ñzînga), depois do seu baptismo, como sucessor do seu pai ao trono ainda vivo. O episódio terá levado a que o filho do monarca kôngo fosse condenado em tribunal e mais tarde enviado à Nsûndi, de acordo com os usos e costumes kôngo. Autores que descrecem este episódio argumentam que a reação e indiferença do seu pai, Nzîng’a Nkûwu, terá o levado de volta às práticas do feitiços, que aparentemente deveria ter renunciado para receber o baptismo cristão.

 

Mas estamos diante de uma confusão de princípios que apenas a influência da cultura europeia permite. É que tradicionalmente a sucessão no Kongo nunca foi de pai para o filho, como ocorria nas monarquias europeias, mas de tio materno para o sobrinho. Será provavelmente o facto de Dom Afonso ter abraçado fortemente a fé cristã que o levara a acreditar no direito de suceder a seu pai, o que lhe valeria a deportação compulsória para Nsûndi. Ao ter negado a sua cultura materna em favor da cultura portuguesa cristã, chagamos à compreensão de uma passagem da tradição oral, conservada por várias linhagens de kimvêmba, segundo a qual Mvêmb’a Ñzînga terá morto a sua própria mãe, que na verdade é uma metáfora que considera mãe a cultura do seu povo (na lingua kôngo bungûdi, que significa mãe, converge-se com bukûlu, que quer dizer cultura.

Embora se diga que soldados portugueses, deixados por Luís de Sousa para guarda do príncipe kôngo, o teriam seguido a Nsûndi, a versão mais difundida pelos autores diz que o rei, Ndo Nzwâwu Ñzîng’a
Nkûwu, terá enviado os ngâng’a Nzâmbi para consolação do seu filho naquele exílio. Contudo, para a sua liberdade, apenas Makunku de Mbânz’a Kôngo (ou Nsaku Ne Vûnda de Nsôyo dya nsi) tinha poder
para decidir, e não o rei seu pai. Há outras versões que sustentam que na verdade Ñzîng’a Nkuwu teria nomeado seu filho como governador de Nsûndi, como Mani Nsûndi, e depois ordenado que lhe acompa-
nhassem os cristãos para que sua fé não estagnasse, ou ainda para evangelizar Nsûndi.

No velho Kôngo, de acordo com os costumes em vigor naquela época, o governante sempre deveria ser eleito e legitimado por instituições próprias constituídas, e por isto mesmo o rei do Kôngo (Mani Kôngo) não dispunha de alguma preponderância em relação as questões de sucessão. O princípio da eleição aplicava-se a todas as jurisdições locais desde o kifuka (o mais baixo escalão de autoridade entre os Kôngo, equivalente de comuna) até kintînu (o mais alto escalão administrativo).

Como consequência desse sórdido episódio, depois da chegada de Dom Afonso I, acompanhado com seus guardas europeus, em Nsûndi passara a usar-se o termo mindele como sinónimo de espíritos malfeitores. Surgirão simultaneamente também rumores sobre a existência de um poderoso Mpânzu’a kitinu, que seria outro filho do monarca Ñzîng’a Nkûwu de acordo com alguns historiadores (J. Cuvelier), mas desconhecido da tradição.

Além de não aparecer nos registos dos baptismos de Junho 1491, que envolveram toda a família real, Mpânzu’a Kitinu ou Mpânzu’e Lûngu (Mpânzu’a Lûmbu) na verdade consubstancia apenas um título do chefe da segurança real que, agido em conformidade com a constituição kôngo fazendo-se acompanhar
com grande efectivo de tropas oriundas de Nsôyo, local de residência do consagrador do monarca.

Por alguma razão Dom Afonso I acabará mesmo feito governador de Nsûndi, provavelmente com a força dos seus aliados, tal como aliás reza sobre a linhagem Mvêmb’a Ñzînga.

A região mergulhará em conflitos contínuos até a coroação do mesmo como rei do todo o Kôngo (1506/1507), com ampla ajuda dos portugueses. Em consequência seriam designados, pelos constitucionalistas, os chefes militares. Da linhagem de Mpânzu’a Nzînga e depois Mpânzu’a Lûmbu (Mpânzu’a Lûngu: guarda real) para uma contra-ofensiva militar em repúdio desse comportamento do agora rei Dom Afonso I. Os conflitos gerados duraram cerca de oito meses, com a morte de Ñzîng’a Nkûwu em 1506, e a ocupação efectiva do trono por Dom Afonso em 1507 depois de guerrear e definitivamente vencer Mpânzu’a Nzînga com o apoio dos soldados portugueses14 deixados por Luís de Sousa em Mbânza Kôngo.

 

 

 Extratos do livro: A origem meridional do Reino do Kongo

 

 


 

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