Por Patrício Cipriano Mampuya Batsikama
No nosso primeiro volume desta investigação escrevemos o seguinte, a respeito desta organização tripartite, quanto ao significado simbólico de cada partição:
“NSAKU: Sacerdócio, Presbiterado; Religião (Magia), consagração das Autoridades, Diplomacia, Constituição, Poder Judiciário, Poder legislativo.
“MPÂNZU: guerra, Indústria, Segurança da Corte, Segurança do País, Direito Eleitoral.
“ÑZÎNGA: Administração, Justiça, Poder Executivo (limitado), poder político (limitado), Classe das Elites das
Migrações”. São essas Makukwa matatu malâmb’e Kôngo que remetem ao plano geral da gerência pública do reino. Tudo indica que os Nsâku e os Mpânzu seriam os verdadeiros detentores do poder
executivo, que exerceram através da sua Mãe Nzînga. Assim, temos:
a) Poder legislativo
Os membros dos corpos legislativos e os colégios eleitorais, cujas responsabilidades podemos encontrar nos relatos linhagéticos, são geralmente chamados
Ngudi-za-nkama (Ngûdi’a nkâma,
no singular): quer dizer, as “mães da vida com poder de auto-voto”.
Independentemente de pertencer à linhagem Nsaku ou Mpânzu, levavam o patrónimo de Mfutila62, rigorosamente em todas escalas do poder: (1) «Mfutila wâfuta wân’a ngo muna mfôkolo’andi»,63 o
instrutor que prepara as autoridades; (2) os Myala64: «Myala mya Ñzînga, Ni Nsôngi wasôngela bankwa yâla vana mbâzi’a Nkânga»:
O instrutor que mostrava como governar na Corte do Kôngo. Os membros da família Nsaku e os de Mpanzu são – de facto – considerados como verdadeiros detentores do poder porque orientam e
estabelecem os parâmetros de comportamento social.
As linhagens afiliadas a Nsaku reclamam sempre o “direito de ser mais velho da sociedade”, por isso todo administrativo eleito (do município ao trono) deve ser consagrado pelo Nsaku Ne
Vunda.
b) Poder Executivo
As famílias descendentes de Mazînga eram detentoras do poder executivo em amplo sentido: (i) ocupavam os cargos administrativos de todos os escalões do poder executivo, desde o município, o
districto, a província até o reino inteiro: “Mazînga wazîngila, ntu’a makanda mawônso… Ñzînga wavîta yala mu Kôngo”65 ; (ii) a todos os kôngo da linhagem de Mazînga é delegado esse poder
tradicional de fazer e comandar: “Mazînga ma Tona, mvîl’a nene… Kavwâta nsânga, nânga
meno ma nkosi ye ngo. Teleka kateleka; Ñlûnga kañlûnga”.
Na consmovisão dos Kôngo o poder pertence ao “mais velho uterino”. Numa casa, o primeiro filho tem a autoridade sobre o resto. Nessa lógica, o verdadeiro poder pertenceria aos membros da família
de Nsaku. Perceberemos que os Nsâku (pertencentes à linhagem Nsaku) partilham esse poder com os Mpânzu. Na forma própria do exercício desta partilha, os descendentes de Mazînga são apenas
ministros – no sentido latino do termo. No Kôngo ele são considerados como delegados de Nsaku e Mpânzu para executar os actos da governação. É justamente nesse sentido que Raphaël batsîkama diz
que o poder é aí considerado como “um ser humano”, tendo um lado material e um lado espiritual. O
lado material foi delegado aos Mazînga, que deviam obediência as acções comandadas pelo espírito (célebro) dos Nsaku.
Quando este poder não era executado, ou era apenas timidamente executado, os Makôta e Mankûnnku recuperavam-no para si, e submetiam a autoridade cessante a uma nova fase de iniciação para
a sua eventual re-introdução. O poder só lhe era devolvido se sobrevivesse este outro longo ciclo de rituais e cerimónias de empoderanento e sagracão: “sânga, … meno ma ñkôsi ye ngo”, tal como se
leu.
A seguir: O poder militar
Extrato do livro: "A origem Meridional do Reino do Kongo"