
Ao
Dr.João Martins e Família!
Neste momento de profunda dor e consternação para si e demais familiares, aproveitamos o
ensejo para apresentarmos as nossas condolências pelo passamento físico do Prof.Doutor
Manuel Alfredo de Morais Martins.
Dos momentos que partilhei com ele em Lisboa, na Avenida de Roma, onde pude ver pela primeira vez as fotografias das Grandes Figuras Tradicionais da Damba, o Dr. Martins, nas suas conversas soube falar-me o quanto amava as Gentes da Damba!
Confessou -me o se reconhecimento por certas práticas legíveis da colonização portuguesa em Angola. Mas, que em relação a Damba, onde chegou com a idade de quase 22 anos soube beber do direito costumeiro bakongo da região, com as Autoridades Tradicionais, como,
Mfumu Nakunzi, Kyala kya Ntalu ,Kyala kya Nzinga ,Mfumu Kabata,Mfumu Ndwalu Mbuta,Mfumu Mfumwasuka Lengo, Mfumu Kituma- Kuna Nzunga,Mfumu Makanda,Mfumu Yokola,Mfumu Davidi Mabibi, Mfumu Mazambilu, Mfumu Mbuluma, Mfumu Kaboko, Mfumu Kabiba, Mfumu Malukinzi ku Mbwela,e tantos outros que ele conhecia de cor e
salteado! Foram seus verdadeiros mestres em assuntos africanos. O que lhe estimulou a
escrever a sua obra; " Contactos de Culturas do Congo Português", em 1958.Vale apena ler-se
esta obra. Para as nossas novas gerações da Damba e outras vizinhas. Recomenda-se fazer-se uma leitura retrospectiva da vida da região naquela altura e que muito nos enche de orgulho, porque só assim saberão compreender e interpretarem melhor, o que foi a história da nossa região antes e depois da presença europeia.
Porém, uma situação abordada e com muita emoção e lágrimas nos olhos, foi quando se feria
a morte da sua Filha, na Vila da Damba e sepultada no Cemitério Municipal da Damba ou do
Catorze. Está triste situação marchou-lhe profundamente, por toda vida. Dizia na altura, quão
logo, que a guerra terminasse em Angola, o seu desejo era o de voltar a visitar a Damba e
concomitantemente, tocar a campa da sua Filha! Nesta altura emocionou-se e as lágrimas
seguiram silenciosamente a sua face! Fez silêncio!
Ao retomar novamente o diálogo, voltou a lembrar-se das suas Gentes da Damba, as Famílias,
Paquete Neto, e os seus afilhados, José Pedro de Faria Tufwa, Miguel Laurentino da Silva,
Rómulo Francisco, António Pedro Magalhães, Mfumu Mbenza (Pedro Mbenza), Família
Carvalho Fonseca, Pedro Rescova, Cabo Miguel Zilungu, Soba Kabiba, Costa Makamu e tantos outros que lhe passaram pela cabeça na altura. Lembranças como estas têm a ver com a própria situação vivida antes e depois de 1961.
Todavia, independentemente da situação do início da luta da armada e dos ataques à Vila da
Damba, este Município teve sempre a sua áurea. Quantos não têm a nostalgia dos tempos ali
vividos, sem polícia de ordem pública, enquanto em Maquela do Zombo e Bungo os tinham e
havia sempre queixas da Damba não a ter. Não era vaidade, pois, eles sabiam bem que
estavam numa região de poucas “brincadeiras”! As lutas de ocupação da região foram
fundamentais pelo heroísmo e valentia demonstrados pelo Mfumu Nakunzi, Namputu,
Mbyanda Ngunga, Nkama-Ntambu e outros.
Em Lisboa, ao lançar a sua obra, “Recordações do meu Bornal”, fez fé de ter como seus
convidados os Dambenses. Assim, marcamos presença da Damba, na Sociedade de Geografia de Lisboa, com Miguel Laurentino da Silva “Kota Guelito”, Camilo Afonso, Manuel João Landa, David José, José Eduardo Xavier, Lázaro Martins e outros que a memória não os traz de volta.
Nesta sua obra fazia novas referências à Damba. As obras das construções das duas Missões
Católicas, a masculina e a feminina, da chegada dos Padres Capuchinhos e das Irmãs de
Misericórdia, todos Italianos de Venezia. Dos ritos de iniciação (mukanda, longo), dos Mazandu
(feiras populares) que muito quis saber da sua função social no seio dos Bakongo.E porque não falar da actividade comercial destes Bazombo, que tanto lhes notabiliza! Como não se
relembrar da limpeza das aldeias da Damba, da forma como ornamentavam as campas e os
cemitérios dos seus entes queridos. Tudo isto lhe fascinava a mente! Dos Padres que passavam de aldeia em aldeia para celebrarem as missas e com ele presente.
Foi com ele sim, que a Damba conheceu o seu esplendor com a sua Escola de Artes, onde os
nossos Mestres faziam encantar os visitantes que por ali passavam com as suas lindas mobílias de junco. Eram famosas pela sua textura e qualidade. Para os comerciantes e outros
funcionários da Administração e não só, dava orgulho e fazia beleza tê-las nas suas residências.
Como não falar da beleza da ponte de Junco no Rio Nzadi, no antigo Posto Administrativo de
Nkama-Ntambu! Todas estas lembranças só lhe vinham à mente, quando recebia sua gente da
Damba. Que o diga o Dr.Barrroso Kyala Nzinga, que nas suas curtas estadias em Lisboa,
aproveitava dialogar com ele e falarem da figura do seu Pai e de outras Figuras Tradicionais do seu tempo.
Com ele fiquei a saber que depois da sua saída da Damba para Administrador de Malanje,
mandou buscar os mestres artesãos da Damba para Malanje e Lundas, com a missão de ali
ensinarem os habitantes da região, a fazer o artesanato de junco, uma vez que, o junco
morava naquelas paragens!
A minha mea culpa, mas, foi para mim a melhor forma de nos relembramos deste Homem,
que ajudou a construir a nossa Damba, e elevá-la aos níveis do patamar das Administrações do Concelho que existiam em Angola naquela altura. A Damba pode orgulhar-se desta Nobre
Figura! A nossa Damba consta dos escritos coloniais, era das poucas Vilas que já tinha uma
Biblioteca, apesar de uso restrito para alguns, mas, que lançou as bases para o gosto à leitura!
Daí a existência de muitos intelectuais que começaram a sua formação Primária nesta Bela Vila da Damba, ao Norte de Angola!
Bem Haja! Que a sua Alma repousa na Eternidade do Senhor!
(*) Docente universitário, historiador e actual director da Casa Cultural de Angola na Bahia/Brazil